Um beijo, um queijo, um abraço e um presunto

Essa história de dar beijinhos é uma das convenções sociais que eu preferiria que não existissem. Pra começar, ninguém sabe ao certo quantos são – um, dois ou três? Ficar aquém das expectativas (por exemplo: dar dois beijinhos quando a pessoa espera por três) pode parecer grosseria, ou gerar aquela clássica e odiosa reação: “três pra casar”. Da mesma forma, ir além das expectativas também pode ser constrangedor.

O beijo é um fenômeno cultural por excelência, o que complica ainda mais a situação. No Brasil, em contextos informais, é muito comum dar beijo no rosto, mesmo de quem mal se conhece ou nem se conhece. Isso se aplica entre homem e mulher e entre mulheres, mas nunca entre homens – o que já não ocorre na Rússia, na Argentina, na Itália. Homem beijar homem é normal por lá. Aqui, é indicativo de homossexualismo – excetuando-se talvez apenas o beijo entre pai e filho.

No outro extremo há os países em que beijar só se restringe ao círculo familiar, sendo inadmissível fora dele. Em algumas familias alemãs, é costume os familiares trocarem selinhos – sim, na boca, mesmo. Tenho um cunhado alemão, e o pai dele (igualmente alemão) já me deu um selinho. Fiquei escandalizado, é claro. Ele, o alemão-frieza-distância-formalismo me deu um selinho. Eu, o brasileiro-descontração-samba-carnaval fiquei escandalizado.

Mesmo o lado do rosto que primeiro se oferece para beijar (sejam um, dois ou três beijinhos) é uma convenção cultural. No Quebec, é culturalmente aceitável dar beijinhos em certas situações, como no Brasil. Aconteceu comigo, porém, que alguém ofereceu a outra face. A cena foi ridícula: um encontro de narizes e bochechas, um quase-beijo nos lábios, um vai-e-volta de cabeças indecisas. Dificilmente isso ocorreria no Brasil, porque o brasileiro oferece sempre o mesmo lado.

O beijo era uma saudação usual já nos tempos da Bíblia, em meio ao povo de Israel. Porém, mostrou sua ambigüidade naquele que veio a ser o beijo mais importante da História: o sinal de Judas ao trair Jesus (relatos em Mateus 26:48-49, Marcos 14:44-46 e Lucas 22:47-48). Judas não teria conseguido trair seu Mestre com um abraço, porque é muito mais verdadeiro. Prova disso é que é emocionalmente fácil dar beijinhos em qualquer um – agora, tenta abraçar uma pessoa com quem as coisas não vão bem…

Pelo argumento cultural, recomendo o simples aperto de mão. Embora possa parecer frio, é bem mais seguro. Pelo argumento emocional, recomendo um abraço. É bem mais sincero e significativo; vale mais. Quanto a mim, vou ver se extirpo o “beijo” e o “bjs” do meu vocabulário. Chega: quero dar abraços. Pra ti, meu leitor… aquele abraço!

7 ideias sobre “Um beijo, um queijo, um abraço e um presunto

  1. SamiAguiar

    Sandrine, parabéns por ter um pai que conhece o vocabulário vernacular. Ah! A propósito: já disse hoje que você é uma chata que me ama perdidamente, que não pode ter a mim como seu amantíssimo marido e que, por conseguinte, repele-me? Os bons tempos estão de volta! Hehehe!

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  2. Anonymous

    Nada a ver Martin! Imagina se o beijo nao tivesse na nossa cultura, como os adolescentes iam mandar mensagens de texto sem o BJS? Iam colocar AB? ou ARS? sei nao…. meu instinto de publicitaria diz que isso nao ia pegar!E o pior de tudo? Como o Jo Soares ia terminar o programa???? Abraco do Gordo?? Ah nao guri, podeparar!:Pbjdgrd !

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