Primeira vez em dez anos

Sou motorista há dez anos, mais ou menos. Logo que fiz a primeira habilitação, usava o carro do papai — um saudoso Ford Escort duas portas —, principalmente para ir à faculdade e ir à faculdade (é que foram duas faculdades). Depois de me formar e de me formar (!), fiquei uns dois anos praticamente sem dirigir, do mestrado ao início da carreira profissional. Só voltei a dirigir com regularidade quando me mudei a Porto Alegre, há dois anos.

Há poucos dias, pela primeira vez na minha década de condutor, troquei um pneu sozinho. Até então, só tinha atuado como auxiliar nessa rica tarefa emergencial. Cheguei a pensar em chamar o seguro. “Pagando uma fortuna de prêmio pra seguradora, ainda preciso me sujar trocando pneu?” Nem sei se eu poderia chamar a seguradora pra trocar um pneu, mas nem tentei. Coloquei eu mesmo as mãos na massa. Digo, na graxa.

(Aliás, assim como fiquei sem saber se poderia chamar a seguradora pra trocar pneu, ainda não sei bem pra que finalidades eu posso chamá-la. Desconheço a apólice. Pago seguro de carro há dois anos e nunca precisei da seguradora. É claro que, se cancelasse a apólice, algo aconteceria que precisaria dela no dia seguinte — tudo conforme a Lei de Clark.)

Voltando à troca do pneu: comecei com insegurança, tentando me lembrar das dicas do meu pai, que já auxiliara algumas vezes ao trocar pneus. Cheguei a consultar um transeunte se estava fazendo certo ou passando vergonha; ele me tranquilizou. Ufa. Trocado o pneu, saí de carro e dei uma volta na quadra. “Ok, se o step não despencou, devo ter feito tudo certo.”

Mentira: eu não fiz essa volta de teste. Mas estava mesmo tudo certo.

Depois da experiência, com alguma revolta fiquei pensando no tanto de irrelevância e abstração que tive de aturar nas aulas teóricas de autoescola. Eu achava tragicamente divertido que o teste teórico parecia englobar questões de teste psicotécnico:

Abrindo o sinal luminoso para os veículos, o que deve ser feito pelo condutor, se ainda existirem pedestres retardatários na travessia?

 A) Piscar os faróis e buzinar.
 B) Buzinar alertando-os.
 C) Aguardar que concluam a travessia.
 D) Arrancar normalmente, pois o sinal já está aberto.

Por que em vez de insultar a inteligência dos condutores em formação a autoescola não os ensina a trocar pneu? Ou é só a minha autoescola que não ensina?

2 ideias sobre “Primeira vez em dez anos

  1. Bruno Angelo

    Bah, estou seguro de que essa questão caiu na prova teórica de condução que eu fiz (que, aliás, deve ter sido na mesma época). Entretanto, minha lembrança da opção C era uma versão mais “na cara” (possivelmente uma afetação decorrente do próprio insulto recebido):

    “C) Aguardar que concluam a travessia, pois você é um motorista defensivo.”

    No mais, se os caras fossem ensinar a trocar pneu, provavelmente o fariam numa sequência de cinco aulas práticas extra e obrigatórias… entretanto, a troca de pneu defensiva seria um ótimo aprendizado 🙂

    Saudações!

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    1. Martin D. Brauch Autor do post

      Bruno, meu caro! Demorei a aprovar teu comentário… desculpa. Eu também tenho bastante segurança de que uma questão assim caiu na minha prova teórica — e também de que as opções (tanto a correta quanto as incorretas) eram ainda mais na cara! 🙂

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