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Mardi Gras

Querido leitor,

O título do post não tem nada a ver com o que vou dizer, mas é que hoje é terça-feira de carnaval. Ou talvez tenha, sim, a ver com o que vou dizer… Muita gente diz que o Brasil inteiro pára no carnaval. (Há também quem diga que pára entre Natal e carnaval, mas isso pra mim já é exagero).

Este rápido post é para explicar que meu blog vai tirar não só uma “terça-feira gorda”, como também uma “semana gorda”. E isso não quer dizer que o blog vai estar gordo de cheio de posts, senão que vai estar gordo de tão preguiçoso.

Exatamente daqui a uma semana, estarei na Faculdade de Direito da UFPel realizando minha matrícula – ou seja, ¡adiós, Argentina! E ao mesmo tempo em que tenho muito (sem exagerar, quero dizer MUITO) para contar sobre minhas aventuras aqui (e também desventuras), se já estava atrasado na postagem, agora mesmo é que não vai dar mais. Há muito o que fazer e o tempo é curto.

Uma rápida exemplificação do que tenho pela frente… Saiu num jornal aqui de La Plata que vou dar uma palestra sobre meu projeto na quinta-feira e os interessados já começam a inscrever-se. Isso quer dizer que sim, vou dar uma palestra em castellano, e isso requer uma boa preparação. O jornal também pediu um artigo mais detalhado sobre meu projeto – e quem conhece os jornalistas sabe que eu é que tenho de escrevê-lo, senão dá rolo (ou senão simplesmente vão mudar de idéia). Meus pais chegaram ontem a Buenos Aires, porque sábado próximo é o aniversário da minha mãe e essa viagem é o presente dela. Pois bem, só ia vê-los na sexta-feira, depois do fim do meu estágio, mas acontece que uma prima minha que mora em São Paulo veio a Buenos Aires, e vou pra lá encontrá-la daqui a quatro horas.

Em suma: “semana gorda” (Semaine Gras) para o blog. Se o Papai do Céu permitir que eu sobreviva, el próximo martes ou terça-feira próxima será “terça-feira de começar o regime (de postagem intensiva no blogdoGuri!)”. E, paciência, continuarei com meus malucos posts retroativos.

Sei que admitir uma pausa de uma semana no blog é uma das piores coisas que poderia fazer com meus queridos leitores fiéis, mas espero sua compreensão. Tenho que disfrutar meus últimos momentos (snif) en la Argentina.

Saludos

Martin.

Turbilhão da penúltima semana

Não pode ser! Já estou mais pra cá do que pra lá, ou mais pra voltar do que pra ficar, ou estou há mais tempo aqui do que o tempo que ainda tenho para ficar. Ou, em suma: das cinco semanas de meu período na Argentina, só faltam duas. E já sinto por antecipação que voy a extrañar la Argentina…

Aparte disso, ainda tem toda a complexa questão do meu trabalho. Nas três primeiras semanas, redigi o projeto que tinha na cabeça, fiz as leituras que tinha de fazer (ou pelo menos as que me propus a fazer!) e desenvolvi três capítulos do texto. E, bem, estou feliz com minhas trinta e poucas páginas. Mas agora, na quarta semana, chega o momento em que, como digo de brincadeira, tenho que jogar tudo o que fiz até agora em uma panela, sacudir e ver se explode – ou seja, fazer a síntese, que é sem dúvida a parte mais difícil.

As fotos de hoje são do Parque Saavedra, por onde passo todos os dias no caminho entre a hospedaria e a fundação. Ali, à tardinha, uma galera se reúne para jogar futebol, outros vão caminhar ou correr, uns casaizinhos ficam a namorar, e alguns grupos de amigos se encontram para tomar mate ou jogar conversa fora. O lugar é uma tranqüilidade só. É a ilustração perfeitamente contrária ao turbilhão de idéias e preocupações em que está minha mente neste início de semana.



Fechado para balanço

Minhas defesas baixaram e até peguei até um leve resfriado (coisa que não me acontece nem no mais frio do inverno). Já me disseram que estou pedindo, que sou louco, que quero trabalhar como um cavalo durante a semana (a pergunta é: cavalos fazem trabalho intelectual?) e ainda tirar todo o suquinho dos passeios durante os fins de semana de passeio. Para mim, en realidad la culpable es la Argentina, que me suga todas as energias.

Fiquei o dia inteiro em casa, recompondo as forças… e, claro, fazendo planos de passeios. Meu próximo dia em Buenos Aires será sábado, se tudo der certo com meu trabalho na fundação ao longo da semana. Pretendo visitar o Museo Nacional de Bellas Artes (MNBA) e o Museo de Arte Latinoamericano de Buenos Aires (MALBA), que têm coleções gigantes e que nem em um dia inteiro poderia percorrer por completo.

Uma tarde de muitos cambios

Não há muita mudança (exceto a climática) na minha rotina por aqui. O desenvolvimento do meu trabalho na fundação segue um cronograma inicialmente determinado – só o que tem acontecido é eu me adiantar um pouco. E também o grupo de pessoas com quem convivo não varia muito: vejo e revejo todos os personagens dessa minha história argentina que tenho contado aqui no blog, desde fins de janeiro. Até meus passeios são um pouco rotineiros: por semana, passeio um dia em La Plata e outro em Buenos Aires.

Mas hoje tive uma tarde de muitas mudanças. Finalmente me responderam da ABUA (Asociación Bíblica Universitária Argentina). Já tenho os contatos de vários estudantes cristãos! E mais: me convidaram a ir sábado em um passeio ao Tigre, delta do Rio da Prata. Outro dos contatos é de um rapaz aqui de La Plata que está interessado em abrir o primeiro grupo da ABUA na Universidad Nacional. E o impressionante é que é quase meu vizinho. Enquanto combinava tudo com o pessoal da ABUA por chat, chegou um e-mail de um canadense que leu o resumo do meu projeto de pesquisa e se interessou. Ele está em Buenos Aires e quer conhecer a fundação e trabalhar com desenvolvimento sustentável. E como vou a Buenos Aires amanhã, combinamos de almoçar juntos.

Em suma: em uma hora, passei a ter programação e companhia para o fim-de-semana e para meu dia de passeio em Buenos Aires. Perfeito!

Terceira semana

Nem acredito, mas já começou minha terceira semana de trabalho aqui. Já estou quase na metade do estágio – como passou rápido o tempo! Hoje, dia que segundo os planos seria o último para buscar artigos para um estudo sobre a Nova Economia Institucional, já (quase) terminei a revisão do terceiro paper. Ou seja, continuo adiantado no cronograma.

Se o rendimento amanhã continuar nesse passo, é certo que quarta-feira vou a Buenos Aires para passear pelas livrarias e ir ao famoso Café Tortoni. Calculo que um expresso ali deva custar um cinco dólares, mas prometi a meu orientador que visitaria o lugar, nem que fosse para comprar uma bala de café. Promessa é dívida.

Mas não tenho tratado de produzir bastante apenas para poder passear sem culpa. Meu estudo tem gerado reflexões e conclusões bastante interessantes, e as hipóteses que formulei inicialmente se estão confirmando. Em suma, estou muito satisfeito. Hoje voltei para casa feliz da vida, achando tudo lindo e maravilhoso, e não é só porque o dia realmente estava ensolarado e azulado e com temperatura agradável (enfim!), mas principalmente porque mal cheguei à metade do estágio e já posso dizer que vir à Argentina foi uma escolha feliz e de sucesso.

Deixar a modéstia de lado e admitir isso talvez seja bastante argentino da minha parte. Não é arrogância – é levantar a auto-estima. Tampouco posso dizer que agora eu seja o Gardel (“ser Gardel”, por aqui, equivale a “ser o máximo”), mas tenho aprendido aqui que um pouco de orgulho (que, sim, tem um bom sentido) não faz mal.

Domingo em La Plata (não em Buenos Aires!)

Horacio havia convidado para o almoço de domingo. E para lá me fui, às 11h da manhã, não sem antes me desembaralhar de um montón de números: saí de casa à rua 55 quase esquina com a 2, caminhei até a rua 1, entre as ruas 51 e 53, peguei o micro 338 para City Bell, desci na rua 456 e encontrei a casa de número 1426. A casa de Horacio fica em um simpático subúrbio de classe média de La Plata, chamado City Bell. É um bairro tranqüilo, arborizado, com terrenos grandes, casas espaçosas e com piscina. Enfim, como disse: um subúrbio de classe média.

De início, enquanto ele preparava a parrilla (carne e verduras na churrasqueira), discutimos algumas idéias para meu projeto sobre economia da mudança climática. Acontece que sexta-feira foi publicado o 4º relatório do IPCC (painel de cientistas da ONU) sobre mudança climática, prevendo um aumento na temperatura entre 1,8 e 4ºC até 2100, o que teria várias conseqüências graves. Os jornais de toda a Argentina e também pelo mundo afora tinham como manchetes principais: “a mudança climática é real”. Todo o mundo relacionava o relatório com o calor que tem feito nos últimos dias e comentava e sobre a gravidade do efeito estufa e tal e coisa. E Enrique e eu nos sentíamos como “profetas” que nunca receberam crédito e respondíamos: “Eu avisei! Eu avisei!”.

Pois bem, nesse contexto de súbita conscientização pública, disse a Horacio nada mais que o óbvio – é preciso aproveitar a oportunidade para divulgar meu projeto e o trabalho da Fundación Biosfera. Pretendo escrever um artigo para publicação em jornal por aqui. Além disso, vamos divulgar uma palestra sobre o meu trabalho, a ser feita ao fim do meu estágio, com sorte contando com o apoio da Universidad Nacional de La Plata. A idéia me atrai muito; vejamos se dá certo!

Depois da conversa, almoço com muitos familiares e amigos do anfitrião e banho de piscina. E às 17h saí meio que às pressas de volta ao centro da cidade, para ir ao culto. Sim: Enrique e eu tínhamos ficado sabendo que a pastora tinha voltado das férias e que hoje haveria culto. Mas não houve. Cheguei ao centro às 17:30, caminhei umas 20 quadras (!) até a igreja e cheguei lá às 18h, horário previsto para o culto. E nada: tudo fechado, ninguém por ali. Dei uma volta, fui a um cyber, falei um pouco com uma de minhas irmãs, que estava online, e voltei à igreja às 19h. E nada.

Por fim, bastante desapontado, resolvi parar de tentar (!) e voltar para casa. Nisso, é claro, depois de todo o calor que fez nos últimos dias, começou uma tormenta. Nem precisaria dizer que não tinha guarda-chuva. Pensei em tudo o que tinha que caminhar e pedi ao Papai do Céu que segurasse a água lá em cima só um pouquinho. Por um minuto fiquei esperando sob um toldo; a chuva logo parou e caminhei rápido para casa. Mal pus os pés em casa, voltou a chover. Em uma aplicação teológica de uma idéia de Adam Smith, e com muita licença poética, recomendo: nunca duvides da divina mão invisível.

Trabalhando (mas nem tanto) no sábado

É sábado, mas o fim de semana não começou para mim. Resolvi ficar em casa adiantando serviço, para poder folgar um dia útil em Buenos Aires. E talvez tenha sido uma das minhas melhores escolhas que fiz desde que estou aqui: o calor que fez em La Plata durante o dia foi terrível, mas quase não o senti, porque fiquei o dia inteiro em casa. No fim das contas, não trabalhei tanto quanto queria – mas desse comentário se deve descontar minha auto-exigência quase neurótica.

Aliás, quando ao fim da tarde falei com minha mãe pelo voip e lhe contei isso (que não tinha trabalhado tanto quanto queria), Enrique me olhou com cara de reprovação, como quem diz “tsc tsc”. (Haja cultura de HQ para entender isso!) De novo, ele disse que exijo demais de mim mesmo, ainda mais em um sábado… Pois bem, eu sou assim. Aí está um dos motivos por que talvez devesse fazer terapia – mas meus pais acham graça quando sugiro isso.

Tarefas domésticas

Foi bom enquanto durou, mas o estoque de roupa tinha suas limitações: chegou o dia de ir ao “lavadero automático”. O negócio fica a uma quadra de casa. De véspera tinha dito ao chefe que chegaria um pouco mais tarde por causa de tarefas domésticas. Peguei a sacola de roupa e me fui, às 8h da manhã. Grande: só abria às 9h. Voltei para casa e felizmente Virginia disse que me faria o favor de levar minhas roupas uma hora mais tarde. Depois disso, saí às pressas para a fundação. Na volta, acertei as contas (5,50 pesos – muito barato!) com Enrique, que tinha buscado minhas roupas, e fui dobrar e guardar.

E foi aí que veio a nada agradável surpresa: algumas peças estavam um pouco “chicadas”. Encolheram principalmente as meias: de um 42 para um 38, creio eu. O raciocínio de Enrique fez bastante sentido: põem a secadora a funcionar muito forte, para secar mais rápido, para poder secar mais roupas, para ganhar mais plata. Bom, que posso fazer agora? O máximo que vai acontecer é eu ter de ir às compras… E, claro, na próxima vez, secar tudo no varal!

Fevereiro e o trânsito laplatense

Bem se vê que começou fevereiro. De um dia para outro, todos voltaram de sei-lá-onde (Mar del Plata? Punta del Este? Florianópolis?) e a cidade se encheu de gente. Na hora de ir à fundação, vi muitos estudantes caminhando pela rua, o que até então (por óbvio) não vira. Muitas lojas também já estavam abertas. E o trânsito ficou ainda mais complicado.

Vale dizer que aqui a lei de trânsito é, essencialmente, a lei do mais forte. Até agora não entendi bem quem tem preferência em uma rua em que não há semáforo. Me parece que são todos e ninguém ao mesmo tempo. Tudo bem, vão me dizer que é como no Brasil – em um cruzamento sem sinalização, venha o condutor de onde venha, tem que parar. Mas lá é muito mais comum haver placas de “pare”, das quais aqui não há muitas. A maioria dos cruzamentos é sem sinalização, o que dá, sim, um ar caótico ao trânsito.

Para o meu gosto, os argentinos usam a buzina em demasia. Buzinam por qualquer motivo, ou mesmo sem motivo. Pode ser por irritação no trânsito, ou talvez a explicação seja a mesma do parágrafo anterior: já que a lei de trânsito é a do mais forte, cada condutor não só acha que sempre tem razão como de fato a tem.

A frota é algo curiosíssimo. Há muitos carros novos e modernos (muitos dos quais, me disseram, são produzidos no Brasil), mas me lembro da observação que fez meu orientador depois de conhecer Cuba: sua frota tinha parado de evoluir no meio do século XX. Aqui a situação evidentemente não é tão drástica, mas há um grande número de carros antigos; os que me chamaram a atenção são da Fiat, da Peugeot e da Renault. Táxis, creio que tenha visto poucos novos.

E, tendo em vista a lei do mais forte, muitos dos carros que circulam na cidade estão amassados aqui ou ali. Pouco tempo antes de eu chegar à Argentina, Horacio, el jefe, sofreu um acidente. Felizmente ninguém se machucou, mas a porta do seu carro ficou toda amassada. E não é que seja um mau condutor. Já andei com ele e sei que não é o caso. Considerando o trânsito daqui… se entende bem que esse tipo de coisa seja freqüente!

Dia-a-dia na fundación

Na primeira semana, o trabalho foi tranqüilo, porque na fundação estávamos somente Horacio (el jefe) e eu. Basicamente lia, escrevia e às vezes atendia ao telefone. Há muita procura pelos cursos oferecidos pela fundação – culinária, cultivo de fungos comestíveis, hortas caseiras e coisas do estilo. Em uma semana e pouco consegui produzir bastante, de sorte que já tenho 20 páginas de meu potencial trabalho de conclusão de curso. Meu horário de trabalho se consolidou – das 8:30 às 19:00. Tenho minha própria mesa, onde posso ligar meu computador e usar internet banda larga, principalmente para minhas comunicações (com orientador, professores, família) e consultas bibliográficas.

(Foto que Horacio sacou sem me dizer, logo se vê – senão não estaria assim tão sério!)

Agora, minha segunda semana de estágio, a equipe da fundação começou a voltar das férias. A gentil secretária Mercedes, uma senhora que me ajuda a revisar o castellano dos meus escritos, e Martín, um rapaz que também estuda economia e que trabalha na mesma sala que eu, são os mais assíduos. Também Mae, uma das intercambistas estadunidenses, passou a trabalhar na fundação em um programa de conscientização e comprometimento ambiental de candidatos a cargos políticos.

A bem da verdade, sinto falta de um pouco de sossego para realizar minhas tarefas, que requerem bastante concentração – ler e escrever! Mesmo assim, é divertido ter companhia, e nosso ambiente de trabalho é bastante descontraído. Particularmente, gosto do senso de humor comedido (quero dizer, na medida certa) de Horacio, e também da companhia de Mae, que tem mais ou menos a minha idade e, como eu, algumas dificuldades de comunicação. O almoço preparamos nós mesmos – Mae, Horacio e eu. Isto é: estou aprendendo a cozinhar, inicialmente comidas bastante singelas, é claro. Na verdade, para mim toda a vivência aqui tem sido uma grande aprendizagem – que por certo não se restringe à economia da mudança climática!