No Brasil muita gente insiste em dizer que fala brasileiro em vez de português brasileiro. E isso até se justifica, já que idioma é um conceito bastante arbitrário. O que se fala no Brasil, a meu ver (a meu ouvir?), está mais próximo do espanhol do que do português falado na terrinha dos nossos tataravôs Joaquim e Maria.
Se isso não é verdade quanto a todas as variedades lingüísticas brasileiras, pelo menos o é quanto à das cidades do sul do Rio Grande. Outra possibilidade é meu ouvido seja muito burro, mas a verdade é que me soa muito mais fácil de compreender o espanhol do que o português chiado e quase desprovido de vogais que se pode escutar na RTP, ora pois.
Voltando ao meu argumento: se o português brasileiro na sua modalidade gaudéria (1) está mais distante do português europeu (2) do que do espanhol argentino (3), por exemplo, por que (1) e (2) formam um idioma, e não (1) e (3)?
Porque o critério é arbitrário. Exagero meu, porque não se trata de pura e simples arbitrariedade: deve ser cultural ou histórico ou algo do estilo. Pois bem: por esse critério, todos nós – brasileiros, argentinos, italianos, franco-canadenses e romenos, para citar apenas alguns – deveríamos falar diferentes dialetos de latim.
Toda essa digressão boba sobre lingüística (e para quem estudou tão pouco de lingüística, melhor era ter ficado quieto, mas quis brincar um pouco!) era para dizer que, se existisse o idioma brasileiro, talvez também pudesse existir o argentino. De um lado, temos o latim; de outro, o idioma brasileiro, o argentino, o canadense… Onde fica o meio termo?
De qualquer forma, o idioma argentino certamente teria suas peculiaridades. Ao longo de meus primeiros dias aqui, já assimilei algumas delas, e sigo aprendendo. Vejamos…
- Tú não existe na Argentina. Aqui se usa o voseo – tratamento por vos em situações informais. Nas formais, usa-se o Usted. Então temos: yo, vos, él/Usted, nosotros, ellos/Ustedes. Aqui tampouco existe o vosotros: seja formal ou informalmente, o tratamento no plural é Ustedes.
- A letra ll (que em espanhol é uma letra só) e a letra y, quando seguidas de vogal, são pronunciadas como algo entre j do espanhol e o x do português. Yo me llamo Yolanda se pronuncia como algo do tipo xô me xamo Xolanda. Um quadrinho.
- Um aspecto que achei muito interessante é o do s em fim de sílabas ou palavras, que às vezes se pronuncia como um h aspirado: ¿cómo estás? = ¿cómo ehtah?
- A distinção entre b e v não é muito clara. Para mim soam iguais; não como b nem como v, mas como um som intermediário.
- Também notei que muitas pessoas dizem “esteee…” no meio do nada. E não é que encontrei na internet? Trata-se de uma muletilla coloquial, assim como temos, no português: assim… tipo assim… então…
Uma de minhas irmãs (como sei que ela vai ler isto, vou ter que dizer: não me refiro a minha irmã que mora na Alemanha, mas À OUTRA) queria que eu falasse espanhol… direito: tú, vosotros etc. E vim pra cá com essa intenção. Mas desisti rápido. É como pedir que eu fale português em vez de brasileiro; não faz sentido! Aqui, não falo espanhol – falo argentino!