Como comentei no primeiro texto desta série, cada um de nós, mesmo sem formação jurídica, precisará negociar um contrato em algum momento. Essa necessidade pode angustiar quem não tem formação em Direito, mas não há motivo para pânico. Compilei cinco dicas:
1)
A primeira é bastante óbvia, mas não por isso poderia ser dispensada: sabe aquilo de “não sou advogado, não vou entender, não adianta nem ler”? Nem pensar. Lê todo o contrato.
2)
Se estiveres diante de um contrato proposto de forma unilateral e padronizada pelo outro contratante, que não te dá chance de discutir ou modificar qualquer aspecto substancial, estás diante de um contrato por adesão. Nesse caso, resta identificar os riscos de contratar, ou pedir a um advogado que os identifique, sem pretensão de alterar o texto. (Pode acreditar: a operadora de telefonia celular não vai mudar seu contrato-padrão só porque estás pedindo.)
Se os riscos forem excessivamente altos, talvez o mercado ofereça alternativas. E se decidires assumir os riscos, tens a vantagem de que, em caso de problemas posteriores, o contrato será interpretado de forma mais favorável a ti. Essa interpretação mais favorável é garantida por lei.
3)
Uma coisa é a necessidade de um padrão. Por exemplo, é difícil imaginar uma operadora de telefonia (ela de novo) personalizar profundamente os contratos que tiver com cada usuário. A gestão contratual ficaria inviável. O serviço de telefonia varia entre os usuários, mas nem tanto.
Outra coisa bem diferente é a conveniência de um padrão. Para a gestão contratual de uma imobiliária, por exemplo, pode ser conveniente usar um mesmo modelo para todos os contratos. Porém, isso não quer dizer que a atividade da imobiliária imponha a necessidade de padronizar. Cada locação tem especificidades que dependem do imóvel, do locador, do inquilino. Nesse contexto, até faz mais sentido personalizar que padronizar.
Dessa forma, ao receberes um contrato “inalterável”, identifica se há real necessidade ou apenas conveniência de padronização. Se te enviarem uma primeira minuta contratual já em formato não editável (por exemplo, PDF), dizendo que não serão aceitas alterações “porque o contrato é padrão” ou “porque é gerado pelo sistema”, desconfia e questiona. É assim porque precisa ser, ou porque não estão dispostos a negociar? Pede uma minuta editável.
Se notares resistência, pensa se queres mesmo estabelecer uma relação contratual com um contratante inflexível, que te trata como número e não como parceiro. Talvez consigas encontrar alguém mais disposto a negociar e preparar um contrato que atenda tanto aos interesses dele quanto aos teus. Não há arrogância em querer ser tratado como VIP. Todos merecemos isso.
4)
Contratos são documentos importantes no mundo jurídico, porque criam direitos e obrigações. Os advogados que os elaboram empregam certos termos técnicos do Direito. Tudo certo e normal.
Porém, um contrato que só alguém com formação jurídica consegue entender tem algo de errado e anormal. Lembrando a primeira regra de ouro de Deirdre McCloskey, se um texto não está claro, a culpa é de quem o escreveu, nunca do leitor. Portanto, busca esclarecer o que está difícil de entender, corrigir erros e ambiguidades, equilibrar direitos e obrigações.
5)
Ao pedir auxílio jurídico quanto a um contrato, identifica o que é jurídico e o que é negocial. Teu advogado pode indicar o limite máximo de uma multa contratual, com base na lei e nas decisões judiciais, e talvez queira até opinar – mas não necessariamente queira sugerir ou decidir se haverá uma multa contratual no teu contrato e de quanto será. Ele poderá te ajudar a identificar os riscos da contratação – mas não necessariamente queira opinar ou te influenciar quanto a assumir ou não esses riscos. Enfim: teu advogado pode ajudar com questões jurídicas em um contrato, mas em regra as decisões negociais cabem a ti, como dono do negócio.
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