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Em Budapeste visitei até museu

Com tantos passeios por Budapeste (e ainda faltam algumas histórias a contar!) durante a Expedição 2015, visitei apenas dois grandes museus: o Museu Nacional da Hungria (Magyar Nemzeti Múzeum) e o Museu de Artes Aplicadas (Iparművészeti Múzeum), ambos no centro de Peste. Seria impossível comentar exaustivamente sobre cada as atrações de cada um, por isso me atenho a comentários sobre as favoritas – sejam do público em geral, sejam minhas.

Museu Nacional da Hungria

(mapa, website em inglês)

O Museu Nacional da Hungria foi fundado em 1802, mas só em meio século depois mudou-se para o grandioso palácio neo-clássico onde hoje se encontra, construído entre 1837 e 1847 pelo arquiteto Mihály Pollack.

A escadaria da entrada leva ao primeiro andar, onde, logo à esquerda, está exposta em uma sala com iluminação controlada uma das peças mais valiosas do museu: o manto da coroação, em tecido de seda bizantina bordado com fios de ouro e prata. Conforme a inscrição em latim na própria peça, o manto foi confeccionado por ordem do Rei Santo Estêvão (o primeiro rei da Hungria) e sua esposa Giselle no ano 1031. No site oficial há mais sobre a história do manto.

Ainda no primeiro o andar, há Entre o Oriente e o Ocidente, uma mostra arqueológica permanente, com artefatos encontrados no atual território da Hungria desde 400.000 a.C. até o século IX da era Cristã, quando os magiares se estabeleceram na região.

No segundo andar, está a grande exposição permanente sobre a História da Hungria, que contempla desde a criação do Estado Húngaro (em 896) até a queda do regime comunista (em 1990). Gostei particularmente (como tende a ser o caso) da parte que mostra móveis, vestimentas e objetos dos séculos XVIII e XIX, quando a Hungria estava sob o domínio da dinastia dos Habsburgos. A parte sobre a Segunda Guerra (da qual a Hungria participou do lado perdedor) decepcionou; parece haver uma perspectiva histórica distorcida, de vitimização, como se a participação do Estado Húngaro tivesse sido totalmente passiva.

Uma das minhas partes preferidas do museu conta a história de um piano muito especial. Foi fabricado por Thomas Broadwood, de Londres, que construía os melhores e mais modernos pianos da época, e enviado a Viena em 1817. Pertenceu a ninguém menos que Beethoven, que, segundo o relato histórico, amava o instrumento e o utilizou até vir a falecer. O piano foi adquirido em um leilão por C. A. Spina, um negociante de arte e editor de música. Em sinal de respeito, Spina doou o piano a Liszt, o compositor maior da Hungria, grande admirador de Beethoven. Liszt, por sua vez, doou o piano ao Museu nacional da Hungria em 1873. Hoje o instrumento está lá exposto. O nome “Beethoven” está gravado no mogno, acima do teclado.

Museu de Artes Aplicadas

(mapa, website em inglês)

O palácio do Museu de Artes Aplicadas foi, literalmente, o primeiro edifício de Budapeste que me chamou a atenção. No táxi do aeroporto para nosso airbnb, ao ver a linda cúpula com cerâmicas coloridas Zsolnay (do mesmo estilo das que estão na Igreja Mátyás e na Igreja Calvinista, em Buda), mandei uma mensagem para minha irmã, que já estava no apartamento. “Lu, estou passando por uma cúpula verde espetacular… tô perto?

 

A cúpula verde espetacular

Vista aérea (foto de foto) do palácio do museu

No teto da entrada do palácio, mais cerâmica Zsolnay

O palácio do museu por si só vale a visita. Foi projetado pelos arquitetos Ödön Lechner e Gyula Pártos no estilo Secessão, ligado ao Art Nouveau, e inaugurado pelo Imperador Franz Joseph em 1896, para a festa do milênio da Hungria. Notam-se as influências Indo-Orientais e, especialmente na parte externa, o uso da cerâmica Zsolnay.

A coleção permanente inclui peças de mobiliário, têxteis, vidros, cerâmicas e obras de arte. No dia da nossa visita, as mostras temporárias eram sobre arte islâmica e sobre a obra fantástica e criativa do próprio Lechner.

Vitral da cúpula

O pátio interno e as galerias com arcos indo-orientais

Detalhes dos arcos próximos às escadarias

Aquincum: a origem romana de Buda

Não conheço a Itália (ainda). Já vi algumas construções ou ruínas romanas na Alemanha (em Bonn) e no Reino Unido (em York). Por isso, estava bastante curioso para conhecer as ruínas romanas de Aquincum, ao norte de Buda. Num dia de folga, atravessamos de metrô para a estação Batthyány ter, de onde tomamos um trem HÉV até o Museu Aquincum. Chegando lá, fiquei muito impressionado com o tamanho do parque arqueológico.

Panorama do parque arqueológico de Aquincum

Em meados do primeiro século depois de Cristo, os romanos estabeleceram um castrum, assentamento militar para fins de defesa, na região da atual Óbuda (literalmente, Antiga Buda). Ao norte dali, formou-se o assentamento civil que deu origem a Aquincum.

Em 106 d.C., o Imperador Traianus elevou Aquincum ao status de capital da província romana de Pannonia Inferior. Seu sucessor, o Imperador Hadrianus, declarou-a Colonia Splendidissima. No seu auge, Aquincum chegou a ter entre 50.000 e 60.000 habitantes.

Nos seus cinco séculos de existência, Aquincum chegou a uma área de 2,7 quilômetros quadrados. Os muros da cidade tinham 1,5 quilômetro de extensão, e o aqueduto, 3,5 quilômetros. Havia dois anfiteatros – um civil, para 5.000 ou 6.000 pessoas, e um militar, para 13.000 pessoas – e dois fóruns, importantes centros da vida pública romana. Também havia 9 banhos públicos (apenas 2 a menos que Roma!) e 4 banhos privados. Já naquela época surgia a tradição das termas de Budapeste.

A cidade começou a decair a partir das invasões dos Sármatas (povos iranianos), em meados do século IV, e dos Germanos, a partir do século V. Na Idade Média, Buda surgiu onde ficava o campo de legionários de Aquincum; no outro lado do Danúbio, Peste surgiu a partir da fortificação romana de Contra-Aquincum.

Em 1778, um vinicultor de Óbuda descobriu resquícios de de um sistema de aquecimento de uma antiga casa romana. Foi a primeira descoberta arqueológica ligada à cidade de Aquincum. Aos poucos, uma área maior foi escavada, embora chegando apenas a um quarto da área original da antiga cidade.

As ruínas visíveis hoje demonstram o impressionante nível de urbanização de Aquincum: ruas calçadas, fórum, tribunal (basilica), anfiteatro, mercado público (macellum) e aqueduto, templo (Mithraeum), além de prédios privados, como casas e lojas (tabernae). É fácil identificar as fornalhas para o aquecimento das águas dos banhos e o avançado sistema de aquecimento das casas: sob o piso passavam canais de água quente e vapor.

Junto ao muro da cidade, hoje está o lapidarium, com diversos túmulos, estátuas e monumentos de pedra. Outra atração é a casa de um pintor do século II, reconstruída para demonstrar a arquitetura e o estilo de vida da época. No prédio do museu estão os artefatos encontrados nas escavações.