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Cartagena: quatro dias e queria mais

Para comemorar o aniversário do meu pai, escapamos das temperaturas normalmente baixas do início de junho no sul do Brasil e fomos passar um calorzão úmido em Cartagena de Indias (depois de alguns dias de friozinho de altitude em Bogotá… mas o post virá depois, porque resolvi subverter a ordem — cronológica — por aqui). Muitos amigos já tinham recomendado viajar à Colômbia e, especialmente, a Cartagena. Sábios amigos: a cidade é mesmo linda!

Encontramos no airbnb o nosso QG familiar para esta aventura de quatro dias. Já que estávamos entre sete pessoas, escolhemos um apartamento duplex, com três quartos (e com direito a um terraço ou, considerando a temperatura naqueles dias, torraço!). Localização é tudo: nosso apartamento era bem em frente ao Café del Mar, um bar e restaurante situado no Baluarte de Santo Domingo. Hospedados a apenas alguns passos da muralha de 11 Km que cerca o centro histórico de Cartagena, pudemos caminhar para grande parte das atrações.

Ruas de Cartagena, perto do muro e do nosso apartamento

Free Walking Tour

No primeiro dia do passeio, enfrentamos o sol forte para fazer uma caminhada com um guia voluntário (mas que, claro, aceita e deve receber gorjetas no final do passeio!), do Free Tour Cartagena (também com página no facebook). O ponto de partida foi a Plaza Santa Teresa, ao redor da qual ficam o elegante hotel Charleston e o Museo Naval del Caribe.

Hotel Charleston Cartagena

Ali conhecemos a história de Catalina, uma personagem indígena importante na história da Colômbia. Catalina, filha de cacique, foi raptada pelos espanhóis em 1509. Depois de ser evangelizada e de adquirir costumes europeus, serviu de intérprete entre espanhóis e indígenas. Também foi amante de Pedro de Heredia, o espanhol que fundou Cartagena. O prêmio do Festival Internacional de Cinema de Cartagena é uma estátua da índia Catalina.

Estátua da Índia Catalina em frente ao escritório do Festival Internacional de Cinema de Cartagena

A seguir, fomos à Plaza de San Pedro Claver, dominada pela igreja de mesmo nome. Pedro Claver era um padre e missionário jesuíta que se dedicava a aliviar o sofrimento dos escravos. Ele mesmo se chamava de “escravo dos negros”. Em frente à igreja há uma estátua do santo juntamente a um escravo negro, obra do escultor colombiano Enrique Grau.

Iglesia de San Pedro Claver, construída entre 1580 e 1654

San Pedro Claver y el Esclavo, obra de Enrique Grau

Ainda na Plaza San Pedro há um conjunto de onze esculturas de aço envelhecido do escultor Edgardo Carmona. Elas retratam profissões tradicionais e cenas nostálgicas da antiga cidade de Cartagena: uma costureira, um jogo de xadrez, um afiador de facas…

Junto à igreja de San Pedro Claver há também um claustro e um museu. Nesse complexo se destaca a segunda mais longa sacada colonial do mundo. Foi originalmente construída sobre a própria muralha da fortificação, que teve de ser reconstruída alguns metros adiante.

As sacadas coloniais, aliás, são um dos mais evidentes destaques do centro histórico de Cartagena. Estão por toda parte. Em muitos casos, evidenciam a riqueza dos proprietários — quanto mais sacadas, mais janelas, mais vidro, mais luz, mais opulência.

Hoje muitas dessas sacadas estão carregadas de flores. Uma associação de mulheres de Cartagena aproveitou-se desse costume local e criou o Primeiro Concurso de Embelezamento de Sacadas e Fechadas, realizado na Semana Santa de 2016.

O longo balcão colonial, em frente à muralha

Mais sacadas coloniais

Uma das muitas sacadas carregadas de flores

Passando pela Plaza de la Aduana, chega-se à Plaza de los Coches, onde encontramos logo a Torre do Relógio, a estátua de Pedro de Heredia (fundador de Cartagena) e o Portal de los Dulces — arcadas sob as quais se encontram diversos doces típicos da região, feitos com coco, goiaba, banana ou outras frutas… e, invariavelmente, muito açúcar! Degustação obrigatória.

Pedro de Heredia

Detalhe da Torre del Reloj

No final do Portal de los Dulces, um poema — e mais sacadas coloniais!

No centro da Plaza de Bolívar há uma estátua equestre do libertador da Colômbia (e, como sabemos, de tantos outros países sul-americanos). Ali também fica o Museo Histórico de Cartagena, situado no antigo Palacio de la Inquisición. Infelizmente não chegamos a visitá-lo, mas dizem ser o melhor museu de Cartagena. A Inquisição funcionou em cartagena de 1610 até, pasmem, 1821. Dentro do prédio há cárceres e câmaras de tortura usados para julgar delitos contra a fé cristã. Uma das principais heresias julgadas em Cartagena era a bruxaria.

Estátua equestre de Simon Bolívar

Palácio da Inquisição, hoje Museu Histórico de Cartagena

A pequena e conturbada Plaza de Santo Domingo, dominada pela igreja de mesmo nome, está repleta de artistas e vendedores de rua e cercada de restaurantes. Um dos destaques ali desde 2000 é Gertrudis, do colombiano Fernando Botero, conhecido por suas esculturas redondinhas. O desgaste das mamas da escultura se explica pela crença popular de que tocá-las garante amor por toda a vida!

“La Gorda de Botero”

A caminhada guiada por Cartagena rende muitas outras descobertas, sobre história, arquitetura, gastronomia… nem tudo cabe no blog (e algumas memórias se vão quando demoramos a registrá-las!). Mostro só mais três fotos de que gosto, tiradas no passeio, e passo à próxima visita: o Castelo de San Felipe de Barajas.

Decorações de temas marinhos (sereia e cavalo-marinho) nas portas coloniais de Cartagena

As ruas, as sacadas, e a linda torre da Catedral de Cartagena

A fachada genial deste restaurante argentino chama a atenção

Castillo de San Felipe de Barajas

O Castillo de San Felipe de Barajas (que na verdade é um forte, não um castelo) é a maior construção militar espanhola das Américas, datada de 1657. Situa-se no alto do morro de Sán Lázaro, numa posição privilegiada e estratégica para a defesa da cidade. Fica fora da cidade amuralhada, mas, juntamente com ela, foi declarado Patrimônio da Humanidade pela UNESCO em 1984. O forte tem um assustador labirinto de túneis que vale a pena explorar!

Castillo de San Felipe de Barajas

Vista de Cartagena, do alto do forte

Meu cunhado saindo de uma das portas do labirinto de túneis

Dentro dos túneis da fortificação

Meus pais e minha tia, desbravando bravamente as ladeiras íngremes!

Cartagena à noite

Caminhar pelo centro histórico de Cartagena à noite é totalmente seguro e altamente recomendável. A cidade fica bem iluminada e particularmente charmosa. É possível caminhar sobre longos trechos da muralha, que fica toda iluminada. Ali há até alguma chance de soprar uma brisa que ajude a amenizar o calor (mas melhor não contar com isso; para amenizar o calor em Cartagena, só mesmo ar condicionado!). Há várias opções de excelentes restaurantes e, de novo pensando em amenizar o calor, sorveterias. E nas praças, além dos vendedores (que estarão ali à noite assim como estiveram durante todo o dia!), de vez em quando há shows amadores de música e dança.

Muralha iluminada à noite

Ruas de Cartagena e a torre da Catedral

Sorvete de facebook e de WhatsApp?!

Danças típicas na Plaza Bolívar

Playa Blanca, Isla Barú

As praias na própria cidade de Cartagena não são lá grande coisa. Um dia fomos a La Boquilla, pertinho do Hotel Las Américas. Alugamos uma tenda. Alguns do grupo quiseram massagens feitas pelas insistentes moças que passam por ali. Tomamos água de coco e almoçamos na praia mesmo, refeições servidas por um restaurante próximo. Areias cinzentas, mar aceitável. Mas nada muito glamuroso.

Uma tarde em La Boquilla

No dia seguinte, resolvemos fazer valer a pena: fomos de barco até Playa Blanca, na Isla Barú, ao sul de Cartagena. Ali, sim, tivemos a experiência do que se espera de uma praia caribenha (para mim, foi a primeira experiência dessas): areais brancas e finíssimas e águas cristalinas.

Ficamos por ali mesmo na Playa Blanca todo o dia, mas a próxima parada teriam sido as Islas del Rosario, para fazer mergulho no Mar do Caribe.

Como o acesso rodoviário é demorado e a infraestrutura é bastante precária (restaurantes muito simples, banheiros — bem, na verdade, sem comentários sobre os banheiros), a praia está bastante intocada, ainda. Mesmo assim, claro, com o crescente movimento de turistas (tipo nós!), deverá mudar muito nos próximos tempos.

Não poderia pensar em nada melhor nem mais nostálgico para terminar: fotos de Playa Blanca!

Ao sair de barco, cúpulas da Igreja de San Pedro Claver e da Catedral

Deixando Cartagena para trás em alta velocidade

A caminho de Playa Blanca, passamos pelo Fuerte de San Fernando de Bocachica

A paradisíaca Playa Blanca, em Isla Barú

Águas cristalinas de Playa Blanca

Aquincum: a origem romana de Buda

Não conheço a Itália (ainda). Já vi algumas construções ou ruínas romanas na Alemanha (em Bonn) e no Reino Unido (em York). Por isso, estava bastante curioso para conhecer as ruínas romanas de Aquincum, ao norte de Buda. Num dia de folga, atravessamos de metrô para a estação Batthyány ter, de onde tomamos um trem HÉV até o Museu Aquincum. Chegando lá, fiquei muito impressionado com o tamanho do parque arqueológico.

Panorama do parque arqueológico de Aquincum

Em meados do primeiro século depois de Cristo, os romanos estabeleceram um castrum, assentamento militar para fins de defesa, na região da atual Óbuda (literalmente, Antiga Buda). Ao norte dali, formou-se o assentamento civil que deu origem a Aquincum.

Em 106 d.C., o Imperador Traianus elevou Aquincum ao status de capital da província romana de Pannonia Inferior. Seu sucessor, o Imperador Hadrianus, declarou-a Colonia Splendidissima. No seu auge, Aquincum chegou a ter entre 50.000 e 60.000 habitantes.

Nos seus cinco séculos de existência, Aquincum chegou a uma área de 2,7 quilômetros quadrados. Os muros da cidade tinham 1,5 quilômetro de extensão, e o aqueduto, 3,5 quilômetros. Havia dois anfiteatros – um civil, para 5.000 ou 6.000 pessoas, e um militar, para 13.000 pessoas – e dois fóruns, importantes centros da vida pública romana. Também havia 9 banhos públicos (apenas 2 a menos que Roma!) e 4 banhos privados. Já naquela época surgia a tradição das termas de Budapeste.

A cidade começou a decair a partir das invasões dos Sármatas (povos iranianos), em meados do século IV, e dos Germanos, a partir do século V. Na Idade Média, Buda surgiu onde ficava o campo de legionários de Aquincum; no outro lado do Danúbio, Peste surgiu a partir da fortificação romana de Contra-Aquincum.

Em 1778, um vinicultor de Óbuda descobriu resquícios de de um sistema de aquecimento de uma antiga casa romana. Foi a primeira descoberta arqueológica ligada à cidade de Aquincum. Aos poucos, uma área maior foi escavada, embora chegando apenas a um quarto da área original da antiga cidade.

As ruínas visíveis hoje demonstram o impressionante nível de urbanização de Aquincum: ruas calçadas, fórum, tribunal (basilica), anfiteatro, mercado público (macellum) e aqueduto, templo (Mithraeum), além de prédios privados, como casas e lojas (tabernae). É fácil identificar as fornalhas para o aquecimento das águas dos banhos e o avançado sistema de aquecimento das casas: sob o piso passavam canais de água quente e vapor.

Junto ao muro da cidade, hoje está o lapidarium, com diversos túmulos, estátuas e monumentos de pedra. Outra atração é a casa de um pintor do século II, reconstruída para demonstrar a arquitetura e o estilo de vida da época. No prédio do museu estão os artefatos encontrados nas escavações.

Sábado em Berna

Quando escrevi sobre a semana em Genebra, escondi o jogo sobre a atividade de sábado, porque ela mereceu um post todo seu, com muitas fotos! Na companhia do amigo Atul, finalmente fui conhecer Berna. Depois de morar em Genebra por quatro meses e passar algumas vezes pela Suíça, nunca tinha visitado a capital do país! Não vou dizer que um dia seja suficiente, mas já dá pra ver bastante. Berna é uma cidade pequena, perfeita para caminhar.

O passeio começou pela viagem de trem de Genebra até lá, sábado de manhã não-tão-cedinho (porque ninguém e de ferro). Apesar da neblina, as montanhas e o lago nos brindaram com algumas vistas lindas, como esta – perto de Lausanne, pouco antes do trem se afastar do lago:

Ao chegarmos à estação de trem de Berna, a Valériane – colega minha e do Atul dos tempos de NYU – já nos esperava para nos abraçar na plataforma. Isso é que é hospitalidade! Fomos caminhando (e colocando as conversas de quase cinco anos em dia) rumo ao Rio Aare. Dali se vê o lado sul da Bundeshaus, o Palácio Federal da Suíça, onde funciona o parlamento:

O restaurante para o qual a Valériane nos convidou, à margem do rio, é o Schwellenmätteli (tenta pronunciar que é divertido!). Lá nossa anfitriã não conseguia parar de rir (de alegria, ela disse, mas provavelmente também um pouco de vergonha alheia) das minhas extravagâncias suíças. Rivella é um refrigerante à base de soro de leite; está para os suíços mais ou menos o que o guaraná está para os brasileiros nostálgicos no exterior. Depois do almoço… café? Claro que não: Ovomaltine, também tipicamente suíço. Tudo isso, pontualmente, conforme meu relógio Swiss made.

A Valériane não pôde continuar conosco à tarde, então seguimos Atul e eu para o turismo intensivo! Seguimos caminhando à beira do Aare até o Parque dos Ursos, símbolo da cidade.

Um urso pousou para foto, mas não parecia muito feliz :/

Visto o Parque dos Ursos, fomos ao Altes Tramdepot, o antigo terminal de bondes. Ali há um centro de informações turísticas, onde assistimos a um vídeo sobre Berna – história e atrações. Há também um restaurante (muito bom, segundo a dica da minha irmã).

Além disso, é um lugar estratégico para começar a visita à Cidade Antiga de Berna – inscrita na lista do Patrimônio Mundial da UNESCO em 1983. Dali, é só atravessar a ponte (Nydeggbrücke) sobre o Rio Aare para chegar à rua principal (Gerechtigkeitsgasse) da Cidade Antiga.

Na Gerechtigkeitsgasse (assim como em muitas outras ruas da Cidade Antiga), as calçadas ficam ao abrigo dos prédios que, lado a lado, formam um longo corredor de galerias. No centro da rua há diversas fontes, muitas com esculturas e outras formas decorativas.

Sobre a Nydeggbrücke

As galerias de Berna

Uma das fontes na Gerechtigkeitsgasse

Uma parada ao longo da Gerechtigkeitsgasse fizemos na Einstein-Haus, a casa onde o genial matemático, físico e músico (opa? sim! e tantas outras coisas mais…) Albert Einstein morou de 1902 a 1909. Nesse período, ele publicou 32 trabalhos científicos. Em 1905, conhecido como o annus mirabilis (ano maravilhoso) no campo da Física, aos 26 aninhos (!) ele publicou quatro artigos, dois dos quais estão entre seus mais importantes trabalhos: a Teoria Especial da Relatividade e a descoberta do efeito fotoelétrico, que rendeu a ele o Prêmio Nobel em Física em 1921. Como o próprio Einstein reconheceu, “aqueles foram bons tempos, os anos em Berna”.

De longe já se vê que a Gerechtigkeitsgasse leva à torre Zytglogge, outro símbolo de Berna. Foi construída no início do século XIII e no século XV ganhou um relógio astronômico.

Zytglogge

Zytglogge – detalhe do relógio astronômico

Desviando para uma rua lateral, fomos ver Berner Münster, a catedral de Berna, construída de 1421 a 1893 em estilo gótico tardio.

Berner Münster

Detalhe da porta principal da catedral

É possível subir por escadas a torre de 100,6 metros de altura…

E eu, obviamente, não resisti ao desafio!

Vale a pena, um pouco pelo exercício físico e bastante pelas vistas que se tem da cidade – a oeste:

A leste:

E, ao sul, os Alpes Bernenses:

Detalhe de uma sacada, vista da catedral

Do alto se vê bem o corredor de galerias nas calçadas

Destaque para a rua principal, a torre Zytglogge e, mais ao fundo, a Torre da Prisão

Berner Münster, vista da praça da catedral, à beira do rio Aare

Pouco antes de começar a escurecer, passeamos por volta da Bundeshaus. Do parque que fica no lado sul, com um terraço debruçado sobre o rio, uma bela vista para os Alpes Bernenses:

Fachada sul do Bundeshaus

Em busca de um restaurante para jantar, mais algumas descobertas arquitetônicas interessantes…

Uma caminhada tranquila pelas ruas igualmente tranquilas… (porque às 18h tudo na Suíça fecha e as pessoas começam a se recolher em suas casas!)

Deu tempo até de uma rápida viagem ao passado:

Para não perder o gosto pelas fotos noturnas, a fachada norte da Bundeshaus:

Curia Confoederationis Helveticae – a fachada norte da Bundeshaus

Antes de voltar a Genebra, nada mais suíço que jantar fondue, com vinho da casa. Para o Atul, foi o primeiro; para mim, sei lá, o enésimo – mas sempre gosto! A foto foi para a Valériane, que, mesmo sem poder vir jantar conosco, pelo menos poderia se divertir com nossas turistices. 😀