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Projeto mapa mundi martinbrauch.com

Meus posts de viagem agora estão cartograficamente catalogados! Seguirei mapeando os posts futuros. Para facilitar, incluí o mapa mundi no menu de navegação do site. Há pela web diferentes ferramentas para elaborar esse tipo de mapa, mas resolvi ficar mesmo com o Google Maps, que é simples, eficaz e bastante fácil de usar.

Para ver os posts com relatos de viagem e fotos da cidade ou do país, é só clicar nos Google pins. Por padrão, aparecem apenas os pins de países. Para ver os pins de cidades (agrupadas por regiões), basta abrir o painel do mapa, clicando no ícone do canto superior esquerdo; outra opção é ver o mapa em tela cheia, clicando no ícone do canto superior direito.

Radical

Depois do almoço no último sábado, pensei em fazer algo que raramente faço: tirar um cochilo. Estava cansado e a semana tinha sido pesada; parecia uma boa ideia para repor as energias. Depois de meia hora de taquicardia e tentativas de pregar os olhos, sem sucesso, desisti.

Eram quatro da tarde. Frustrado, saltei da cama e comecei a me preparar para fazer outra coisa que raramente faço. Ao perceber que eu não estava dormindo, minha mãe veio falar comigo e me encontrou passando filtro solar. Fez cara de ponto de interrogação.

1088028_19926489“Vou à praia”, afirmei, com a maior naturalidade.

“Que radical!”, ela reagiu, com cara de espanto.

Eu tive que rir. Não há nada de radical, é claro, em ir à praia num sábado quente de verão em São Lourenço do Sul. Centenas (milhares?) de pessoas fazem isso.

No meu caso, ela tinha razão. Foi radical. Mesmo visitando meus pais – que moram a duas quadras da lagoa – desde o início do ano, a primeira vez que fui à praia, propriamente falando, foi sábado.

Tomei sol (usando três camadas de filtro solar com FPS 360), li vários capítulos de um livro, dei um mergulho… tudo tão óbvio e acessível e agradável. Isso que eu nem gosto tanto de praia.

Tendo ido à praia, nem gostando tanto assim de praia, percebi que é um absurdo não ter escrito nenhuma vez no blog em 2015 – e outro absurdo não ter escrito nele nenhuma vez no último trimestre do ano passado. Tenho muitos assuntos pendentes.

Em 2014, foram muitas emoções. Fiquei internado em um hospital por nove dias tomando antibiótico na veia. Saí do hospital e, no mesmo dia, pedi demissão. Comecei um trabalho ainda mais legal. Não contei nada disso! Absurdo.

A trabalho, ou simplesmente porque sim, viajei um tanto. Fui a Buenos Aires, Curitiba, Frankfurt, Genebra (duas vezes), Limburg an der Lahn (duas vezes), Montreux (duas vezes), Newport News, Nova York (duas vezes), Santo Domingo, Seattle, Washington… e acho que só contei de Buenos Aires! Absurdo.

Começou uma coceirinha por resolver esses absurdos. Ou seja, voltei.

Agora vou ligar pra minha mãe e contar, só pra ouvi-la dizer:

“Que radical!”

Antes que se completem outros três meses

Não sei explicar como funciona esse tal de tempo. Só sei que ele existe. Quer dizer, existe mal e mal. Quando penso que me apropriei dele, percebo que já passou. Ó: passou. E passou de novo.

Nos quase três meses que passaram, trabalhei muito – o que só faz aumentar a sensação de fugacidade do tempo. No escritório, sem contar a rotina normal de análise e redação de contratos, trabalhei no protocolo de dezenove (isso aí!) processos administrativos para aquisição, por clientes estrangeiros, de terras rurais na Faixa de Fronteira. Além do escritório, trabalhei no turno três em mais três projetos de consultoria. Para meu alívio, estão quase concluídos.

Quanto à parte nem-tudo-são-flores do post anterior, sigo longe do equilíbrio desejado. Mas culpar o trabalho longo ou o tempo curto por essa falta de equilíbrio seria insincero. Os culpados são outros.

(O culpado, para ser bem preciso, sou eu. O que quero dizer é que as causas da falta de desequilíbrio são outras. Já explico.)

No meu aniversário (que, aliás, também foi entre o post anterior e este), recebi de um de meus melhores amigos um e-mail bofetada. Ele, sem dúvida, escreveu o e-mail com a melhor das intenções; eu é que, mesmo consciente da intenção dele, li o e-mail como uma bofetada.

No e-mail, ele me contou que se lembrou de mim ao ler uma biografia do teólogo Dietrich Bonhoeffer, um mártir da resistência ao nazismo. A lembrança não foi por causa do prenome de Bonhoeffer (que é um dos meus sobrenomes) nem do prenome de Luther, reformador que teve grande influência sobre Bonhoeffer. A lembrança foi porque, segundo meu amigo, minha autodisciplina seria comparável à de Bonhoeffer.

Bofetada.

Além de me dar vontade de ler essa biografia, o e-mail me fez sentir elogiado por ser lembrado assim por um amigo e, ao mesmo tempo, envergonhado por ele estar enganado. Ultimamente minha autodisciplina anda bastante aquém do apogeu de outrora (acho que um “outrora” só se justifica numa frase que tenha um “apogeu”, né?). A falta do equilíbrio que tanto gostaria de ter, como disse antes, não é culpa do trabalho nem do tempo, nem do pouco tempo que sobra por causa, em grande parte, do trabalho. É culpa da falta de autodisciplina. E a falta de autodisciplina é culpa minha, por óbvio.

Há algum tempo tenho pensado sobre isso. Depois de conversar ontem com minha irmã (sobre os mais aleatórios assuntos, como sempre), fiquei pensando ainda mais e resolvi tomar atitudes. Mas com calma, num crescendo, porque a pressa… é a BFF da frustração!

Decidi reduzir TV e redes sociais radicalmente. De 2009 a novembro do ano passado vivi sem um televisor – e vivi muito bem, obrigado. Não quero nem pensar no tempo que já perdi com televisão desde novembro. Quanto às redes sociais: em 2010, fiz jejum de facebook por 40 dias – e foi tão bom que demorou um bom tempo até ter fome de facebook novamente. Assim como é uma ferramenta legal para manter contato (e por isso reduzirei radicalmente, mas não farei jejum absoluto), às vezes é uma grande perda de tempo. Acho bastante ilustrativo que o primeiro resultado de uma busca no google por “time suck” seja o verbete do Urban Dictionary, que traz a seguinte aplicação da expressão em uma frase:

Ever since I got on Facebook I haven’t been able to stay away. I’m spending hours on it each day – it’s a total time suck, but I can’t stop! Grocery shopping and laundry will have to wait.

É isso aí. A cada dia, um novo passo rumo a uma melhor autodisciplina. (Um dos próximos será ler a biografia do Bonhoeffer!)

Não era pra ser um blog trimestral

Mas nem tudo acontece como a gente quer. E tudo bem, porque os imprevistos da vida, agradáveis ou não, edificam. O lado mais agradável de um hiato na postagem parece ser a diferença de perspectiva que o passar do tempo proporciona. Vejo bem mais claramente hoje que ao longo dos últimos três meses o que realmente importou nesse tempo.

Primeiro, estar com toda a minha família reunida. A bênção de poder reunir com razoável frequência uma família tricontinental compensa até mesmo a forte dor da despedida (sempre acompanhada de choradeira) ao final de cada reencontro.

Segundo, crescer naturalmente no trabalho – e sentir o trabalho crescer naturalmente em mim. É tão difícil acreditar que já completei meio ano de advocacia quanto acreditar que completei apenas meio ano de advocacia. Há desafios novos a cada dia e nem os percebo mais, porque estou cada vez mais acostumado a enfrentá-los sem medo.

Terceiro, cumprir a árdua missão de “mobiliar o apartamento, com calma, simplicidade, conforto e estilo – mas sem torrar grana em luxos”. Há semanas tenho a impressão de que nada me falta em casa. Isso libera minha mente e meu tempo para atividades mais nobres.

É aí que entra a parte nem-tudo-são-flores do post. Apesar dos avanços evidentes, ainda não atingi o equilbrio desejado entre as atividades fora do trabalho: ler, assistir a filmes, nadar, fotografar, estudar idiomas, caminhar, tocar música, escrever. Manter contato com os amigos de longe. Passar tempo com os amigos de perto. Fazer novos amigos.

E, por fim, tem a parte do post em que eu admito um incômodo sentimento de pro-resto-da-vida. Em contraste com os últimos anos (desde julho de 2009) de dinamismo instável, relatados aqui no blog, estou estranhando um pouco a constância dos últimos meses. Antes, vivia incomodado porque não tinha nem mesmo uma vaga ideia de para onde a vida ia; agora, porque tenho a impressão de saber com excessiva precisão para onde vai.

Três meses e pouco, em síntese (de novo!)

Passou tanto tempo e aconteceu tanta coisa que nem sei por onde começo – até porque mal me lembro de onde parei! Então vou adotar uma estratégia nada trivial, considerando minha inclinação natural às narrativas organizadas de forma neurótica, linear, cronológica: vou começar pelo fim.

Estou em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, trabalhando como advogado na área contratual de um escritório de advocacia daqui. Assim que voltei de NYC, em meados de agosto, comecei a procurar trabalho como advogado, enquanto terminava a consultoria para o IISD. A proposta de trabalho surgiu em menos de um mês, no início de setembro, e comecei a trabalhar em 15 de setembro.

Resumindo assim, parece até que foi rápido e fácil… Na verdade, foi uma busca de trabalho que começou durante meu mestrado, ainda em 2009. Em 2010, uma vez mestre, veio o bar exam em NY; depois do bar, veio o estágio no IISD na Suíça; em seguida do estágio, veio a consultoria. Durante a consultoria, fui a NY para fazer o juramento na Suprema Corte em NY e para continuar a busca de trabalho (período, aliás, que eu relatei aqui, em inglês). Por fim, mais um mês de busca de trabalho no Brasil. Toda essa andação (EUA, Suíça) para me trazer de volta à Capital do meu estado natal.

Moro agora no apartamento que pertence aos meus pais, mas nesse meio tempo já fiz umas quantas mudanças e já morei em uns quantos lugares – e, curiosamente, o número de mudanças e de moradas não coincide, já explico por quê! Recapitulando…

  • Em janeiro, morava em Genebra, Suíça.
  • Em fevereiro, fui para a Alemanha, com minha família.
  • De março a junho, estive em São Lourenço, morando sozinho na casa dos meus pais, trabalhando como consultor do IISD.
  • Depois de 40 dias em NYC e 20 dias na Califórnia, …
  • … voltei para São Lourenço em agosto, sendo que quase não parei em casa, …
  • … por causa das viagens a Porto Alegre e São Paulo, na busca por trabalho.
  • Em setembro, quando comecei a trabalhar aqui, meio que morei e meio que me hospedei por dois meses com minha roomie publicitária, designer, professora, genial e sem roupa.
  • Finalmente, em 11/11/11, o inquilino saiu do apartamento dos meus pais (depois de uma enrolação sem tamanho que eu quero mais é esquecer), onde passei então a morar, …
  • … ao mesmo tempo em que ajudei minha roomie (porque ex-roomie é feio) a fazer a sua mudança para outro apartamento.

Em resumo: desde o início de 2011, eu me mudei sete vezes; em média, uma morada diferente a cada 40 dias. Não que eu esteja imune a novas mudanças, pro resto da vida, mas posso dizer com bastante segurança que, em 2011, não me mudo mais. Estou bem instalado no apartamento. Estou amando a ideia de ter um armário – em vez de malas-fazendo-as-vezes-de-armário.

O trabalho tem andado bem e estou gostando muito – de certa forma, para minha própria surpresa! Nunca imaginei que trabalharia em Porto Alegre, nem na área contratual. Tampouco imaginei que teria de escrever, trabalhando em Porto Alegre, memorandos e contratos e análises contratuais em inglês, muito menos que me comunicaria com clientes em espanhol e francês. Estou aplicando o que aprendi (de Direito, de idiomas, de relações interpessoais, de mundo) nas experiências que tive aqui e ali – e aprendendo outro tanto!

Estou crescendo. Ou “estou ficando velho”, outra forma legítima de interpretar a situação.

São muitas novidades, acontecimentos até então inéditos em minha vida. Tenho um trabalho fixo (não freelance), com horário fixo (pouco flexível) e um salário fixo (não por hora). Comprei (tive de comprar) móveis e eletrodomésticos. Ou seja: meus pertences nesta Terra não cabem mais em duas malas de 32 Kg (!). Pior ainda: não cabem nem mesmo no automóvel que comprei (tive de comprar).

“Estás estabelecido em Porto Alegre, então?”

Alguém me perguntou um dia e eu quase entrei em choque. Vamos com calma. Eu amo Porto Alegre – e a vida que tenho aqui e mesmo a perspectiva de continuar aqui por algum tempo ou muito tempo ou quem sabe todo o tempo que me resta de vida. Mas “estabelecido” é uma palavra forte, primeiro porque este ano foi de nomadismo, e segundo porque eu ainda sou apenas um Guri. Não faz três meses que estou em Porto Alegre e no trabalho atual. Então, por favor, ninguém me venha com essa de “estabelecido”. Depois que eu tiver 30 (ainda demora uns aninhos), se eu ainda estiver aqui (quem sabe?), reavalio.

“Mas e NYC?”

Essa é a pergunta mais difícil. Um grande pedaço do meu coração continua lá, mas o momento é de estar aqui. Sei disso mesmo sem entender bem como nem porquê.

“E o que será do blog do Guri?”

Existe, ora, e deverá continuar a existir. (De novo: depois que eu tiver 30 e se começar a ficar forçado ter um blog “do Guri”, reavalio.) O certo é que o blog vai mudar um pouco. Antevejo bem menos aventuras para os próximos dois ou três anos que nos últimos dois ou três. Infelizmente, relatos de viagens deverão ficar menos frequentes, mas não desaparecerão. Afinal, eu gosto mais de viagens que de luxos residenciais. “Um teto eu tenho, mas ainda não conheço a Itália.” Acho que essa frase diz muito sobre minhas prioridades!

“E agora?”

Bah, mas só me vêm com pergunta difícil. E agora… sei lá. Uma das coisas a fazer é terminar de mobiliar o apartamento, com calma, simplicidade, conforto e estilo – mas sem torrar grana em luxos. Outra das coisas é que quero voltar a estudar alemão. E talvez a mais urgente de todas: church shopping, para encontrar uma igreja onde me sinta acolhido e envolvido. Não será fácil, depois da City Grace (onde há a maior concentração dos amigos cristãos que tenho!), mas tampouco impossível. Amanhã, quem sabe? Segundo domingo de Advento – vou visitar uma igreja pela primeira vez.

Três meses e pouco, em síntese

Em março voltei ao Brasil para morar em São Lourenço do Sul (cinco dias antes da enchente). Fiz meu juramento na OAB/RS e tornei-me oficialmente advogado, mas segui trabalhando em home office como consultor para o IISD Genebra e como tradutor freelance.

Essa flexibilidade laboral me permitiu visitar todos (!) os meus tios e primos, bem como muitos dos meus amigos, em Pelotas, São Lourenço, Porto Alegre, Canoas, São Leopoldo, São Paulo e Brasília. Essa intensa atividade explica (sem justificar) o abandono temporário do blog.

Depois de 14 meses nos EUA, 4 na Suíça, 1 na Alemanha e 3 no Brasil, estou de volta aos EUA por dois meses: 40 dias em NYC (motivo principal: fazer o juramento de advogado no Estado de NY) e 20 dias em San Diego, Califórnia (motivo principal: visitar Lu e James).

E depois? Brasil. E aí? Boa pergunta. Deus sabe e é o que me importa. Além disso, se eu tivesse todas as respostas, que graça teria a vida?

Com esse postinho deixo atualizado o blog e exibo minha poderosa capacidade de síntese. Sim, eu a tenho! Só não a uso muito no blog por causa da minha paixão (obsessão?) por detalhes.

Claro que aconteceram muito mais coisas que eu poderia contar, mas infelizmente não consegui contá-las à medida que aconteciam, e a minha vocação é antes para jornalista que para historiador. Portanto, só uma breve retrospectiva antes de voltar às atualidades.

Milênio III, década II

Dezembro foi intenso: faltou tempo (e um pouco de determinação, talvez) para postar. Atendendo aos clamores gerais (ate puxão de orelha de tia eu levei na virada do ano), enfim atualizo o blog, com um resumão resumidíssimo do último mês de silêncio, em vários retroposts:

Outra história daquelas

Daquelas tipo esta.

Um assunto sobre o qual não comentei muito (ou pelo menos não de forma sistemática) aqui no blog foi o bar exam – o exame de ordem do estado de Nova Iorque. No post aquele das 4.000 palavras eu comentei que, depois da minha formatura no mestrado, em meados de maio, tive miniférias e logo comecei o curso preparatório para o exame, no barbri. No início de junho, contei um pouco sobre a minha árdua rotina de preparação, que não mudou muito até o fim de julho, exceto no período em que fui para San Antonio visitar mana e cunha.

Quem acompanhou o blog na época vai se lembrar (e quem não acompanhou vai ficar sabendo agora): os meses de barbri, junho e julho, foram de posts curtos e poucos. Em geral, postei só pra compartilhar alguns de meus olhares fotográficos para a cidade de Nova Iorque, às vezes combinados com momentos esparsos de inspiração literária aleatória e incontrolável. Até que em agosto finalmente voltei à postância normal, mesmo antes de fazer a última prova relacionada ao bar exam – a de responsabilidade profissional.

Vale lembrar meu posicionamento oficial sobre a prova:

[…] não tenho nenhuma base para saber como fui – e nem quero ficar pensando a respeito, porque os resultados só saem daqui a alguns meses (nem estarei mais em Nova Iorque quando saírem). O que posso dizer de consciência limpa é que fiz o meu melhor considerando as circunstâncias. E seja o que Deus quiser [e digo isso da forma mais sincera possível – nada de “força de expressão”].

E então eu parei de pensar nisso. Aproveitei muito bem aproveitados meus últimos dois meses morando em Nova Iorque, e depois vim pra Genebra. Muitas transições. A vida aqui é bem diferente da vida lá. Outros projetos, outras coisas pra me manter ocupado. A ideia era mesmo nem ter muitas esperanças, e deixei isso bem claro para todos com quem falei sobre esse assunto. Claro que muitos amigos seguiram insistindo que tinham certeza de que eu tinha passado… o que, embora não seja mal-intencionado, não ajuda muito; só me coloca ainda mais na responsa, na necessidade (autoimposta) de sempre mostrar bons resultados e de corresponder às expectativas do mundo ao meu redor.

Como já expliquei no meu posicionamento oficial, fiz o meu melhor na prova. Passar seria ótimo, mas não passar não seria o fim do mundo – talvez apenas um sinal de que Papai do Céu não quisesse que eu fosse um big-shot New York lawyer (difícil traduzir isso!). Cheguei a dizer isso pra alguns amigos aqui e ali.

Aliás, saindo do escritório ao final do expediente na minha primeira sexta-feira de trabalho no IISD aqui em Genebra, a Jocelyn, uma colega de trabalho, perguntou sobre a prova da ordem (eu já tinha comentado que tinha feito a prova). Então eu expliquei essa minha postura – nas palavras que usei no parágrafo anterior, mesmo. Pra minha total surpresa, ela respondeu, “bom, se já colocaste essa questão diante do Senhor, talvez Ele possa mesmo responder dessa forma.” E foi assim que, na minha primeira interação com alguém do trabalho fora do ambiente de trabalho, ainda novo na cidade e sem igreja e sem amigos, descobri uma colega de trabalho cristã, e aparentemente a única do escritório. Coincidência?

Até que chegou novembro e comecei a pensar, “o resultado do exame de ordem deve sair em breve.” Semana passada comecei a olhar o site… todos os dias, na esperança de encontrar a lista de aprovados. Mas nada. Chegou um e-mail do barbri, dizendo que os resultados só sairiam a partir da semana que vem. E me determinei, “pronto, não adianta ficar olhando o site freneticamente; o negócio é ter paciência.”

É interessante como determinar-se não significa absolutamente nada. Semana passada, um dia sonhei que tinha olhado a lista e meu nome estava lá. Outro dia, também semana passada, sonhei que tinha olhado a lista e meu nome não estava lá. Sim: na semana passada, sonhei duas vezes com a lista dos aprovados. Por mais que não quisesse me importar com o resultado (“passar seria ótimo, mas não passar não seria o fim do mundo”), a simples determinação de não me importar com o resultado era um sinal de que já estava me importando.

Foi bem isso que me disse a Jocelyn no intervalo de almoço de sexta-feira. Eu tinha contado a ela que a história do bar exam vinha me atormentando… e que eu não queria mais me importar. Mais, ela enfatizou bastante o que eu já sabia: tinha apenas que deixar de lado essa preocupação e confiar em Deus. Pronto. Claro que eu já sabia disso. Mas é tão difícil pôr em prática… Os amigos cristãos  às vezes ajudam simplesmente nisso – lembrando o que já sabemos sobre Deus, mas que às vezes é difícil de aplicar no dia-a-dia. Ótimo. Mais uma vez, eu disse a Deus, “tá contigo… quero paz; não quero mais pensar nesse exame.”

Sábado acordei superdisposto e fui passear. Peguei um bonde até o Palais de Nations (sede das Nações Unidas aqui), de onde caminhei até o Jardim Botânico. De lá, caminhei na Pérola do Lago (um parque) e atravessei de barco até o outro lado do lago, em Genève Plage. Voltei pra casa, fiz um almocinho básico, e à tarde fui até a Piscine de Pervenches, em Carouge: fui nadar, o que não fazia desde abril, quando ainda tinha acesso ao centro esportivo da NYU. Comprei um passe para toda a temporada; pretendo ir regularmente! Cãimbras à parte (normal, depois de tanto tempo!), a primeira vez foi ótima. Eu amo natação. Ria sozinho no vestiário, me preparando pra entrar na piscina. “Não acredito – eu vou nadar!” Haha… Espero que ninguém tenha notado minha felicidade boba. Voltei pra casa a pé. O dia foi lindo – chegou a fazer 19 graus! E em nenhum momento do dia pensei no exame.


Jardim Botânico de Genebra


Jardim Botânico


Pérola do Lago, parque em Genebra.
Não parece a Pérola da Lagoa, São Lourenço do Sul? 😉


Ainda na Pérola do Lago


Cisne no Lago de Genebra


Mont Blanc


Jato d’Água


Jato d’Água e o Salève


Catedral e Jato d’Água


Jato d’Água e cisnes


Jato d’Água e arco-íris

Finalmente vim para o computador colocar os e-mails em dia. Também estava determinado a telefonar para alguns amigos de Nova Iorque (telefonemas pelo Google Voice para os EUA são de graça até o fim do ano – fica aqui a dica!). Então vi que tinha um e-mail do comitê de examinadores da ordem dos advogados de Nova Iorque na minha caixa de entrada. Não podia ser. Eu tinha olhado pela última vez o site da ordem na sexta-feira à noite e o resultado não tinha saído; no sábado é que não teria sido publicado! Mas tinha a diferença de horário… será? Não podia ser. Mas aí entrei no facebook e vi várias atualizações dos meus amigos, anunciando que tinham passado… Não podia ser. Mas era: tinha saído o resultado do exame de ordem.

Aí, o que se faz? Entra-se na caixa de entrada e abre-se o e-mail do comitê de examinadores, certo? Não. Surta-se primeiro. Catei minha prima Carol no Google Talk. “Carol, acontece o seguinte…”, e expliquei a história, acrescentando, “não quero abrir o e-mail. Tô com medo.” Acho que se não fosse a Carol me ordenar que abrisse o e-mail imediatamente (hahaha!), até agora estaria aqui, esperando… sei lá exatamente pelo quê. E então eu abri o e-mail. Diz assim:

The New York State Board of Law Examiners congratulates you on passing the New York State bar examination held on July 27-28, 2010.

Passei. No e-mail, o comitê me dá os parabéns. Só tenho a agradecer a Deus por tudo… pelo meu intelecto, sim, mas principalmente pela capacitação e pela paz de espírito que Ele me concedeu, desde o tempo de barbri, passando pelos os dias de prova, até a publicação do resultado (apesar do momento “low” da última semana). Também sou muito grato a minha família e aos meus amigos (no Brasil e em Nova Iorque), por torcer e orar por mim, e especialmente por me aturar (ou aturar minha ausência) durante os meses estressantes de estudos. O que essa aprovação significa em termos práticos eu ainda não sei; isso também está nas mãos de Deus. A única certeza, por enquanto, é que uma porta segue aberta. 🙂

A terra do relógio

Primeira semana em Genebra: alguns relatos sobre as primeiras impressões e infelizmente poucas fotos. A cidade é mais tranquila que Nova Iorque, mas meu dia-a-dia, ao contrário, é bastante mais conturbado: com 9h no trabalho mais 1h para ir até lá e outra para voltar, não tem sobrado muito tempo para blogar – e menos ainda para passear.

No sábado passado, quando cheguei à estação de Cornavin em Genebra, já estava à minha espera o Fernando, o senhor português que me aluga um quarto no sótão do seu apartamento. Havíamos combinado que ele levaria uma bandeira suíça e eu, uma brasileira, para nos reconhecermos, já que não nos conhecíamos pessoalmente. Deu tudo certo. Primeiro ele me levou ao apartamento, para deixarmos as malas que quase quebraram minhas costas. Fica em Troinex, um pequeno vilarejo ao sul de Genebra, a poucos minutos da fronteira com a França. A seguir, fomos até a região central de Genebra; caminhamos à beira do lago e subimos até a catedral de St. Pierre. Eram cenas conhecidas para mim, de quando visitei a cidade em 2008.


Brasão – Ville de Troinex

No domingo, acordamos cedo para ajudar a preparar um salão comunitário para um almoço que haveria depois do culto. Em seguida fomos ao culto, na Igreja Evangélica Livre de Genebra, e de lá de volta para o salão. À tardinha fomos novamente à beira do lago para aproveitar o dia lindo que todos diziam que eu tinha trazido do Brasil (sendo que eu estava na Alemanha, onde estava chuvoso e mais frio, mas tudo bem). No fim do dia, fomos ao apartamento da dona Madalena, uma senhora que eu conhecia indiretamente (longa história) e que me colocou em contato com o senhor Fernando, seu amigo.

Assim foi que passei um domingo muito social e agradável. Gostei muito da igreja, mas talvez não seja pra mim: há muitos jovens, adultos com mais de 35, e quase ninguém da minha faixa etária. Ainda terei de fazer um pouco de church shopping.


Lago de Genebra e o Mont Blanc (pico da Europa) ao fundo


Lago de Genebra e o Jet d’Eau (Jato d’Água), marca registrada da cidade

Segunda-feira foi o dia de explorar o território. Saí com o carro que o senhor Fernando se dispôs a me alugar e fui até a International Environment House, o local do meu estágio. Encontrei sem problemas (e sem GPS), embora tenha dobrado na esquina errada duas ou três vezes. Fiz algumas comprinhas básicas no Coop e no Migros, dois supermercados de preços bastante acessíveis, perfeitos para estudantes ou jovens profissionais recém-formados com um orçamento apertado (quem?). Achava que o custo de vida seria bem mais caro, mas já penso que não será tanto.

Menos caro ainda será o custo de vida aqui já que decidi, na terça-feira, passar a usar a tgp – “transports publics genevois”. Demora mais, é verdade, mas é bem mais econômico e sem stress. O trânsito em Genebra é surpreendentemente intenso para uma cidadezinha deste tamanhico e são poucas as vagas de estacionamento na rua sem parquímetro. Usando os ônibus e bondes, não preciso me preocupar nem com trânsito nem com estacionamento e posso usar o tempo de viagem para ler. Ou escrever, como estou fazendo neste instante. (E viva o BlackBerry Notepad!)


Alguém me diga se é possível: na casa que fica bem atrás da minha parada de ônibus (Saussac) aqui na minúscula Troinex moram brasileiros! Com um pouco de esforço se consegue ver as bandeiras suíça e brasileira num mastro (na foto, à direita).

Terça-feira foi o primeiro dia de trabalho no programa de investimento do IISD. Conheci boa parte da equipe e já comecei algumas tarefas. O trabalho é uma boa combinação de pesquisa em direito e política do investimento estrangeiro, o que me deixa bastante satisfeito. Os dias no escritório são longos e, ao chegar em casa, não sobra tempo pra muita coisa. Bem, nem teria muito que fazer na pequena Troinex. No findi (que promete ter bom tempo) é que terei algum tempo para um ou outro passeio.

A parte “what really grind my gears” deste post é dedicada a três aspectos de Genebra. Primeiro: os ônibus não são pontuais. Ok, a maior parte dos sistemas de transporte coletivo que já usei não é pontual. E tudo bem – aprende-se a viver com isso, e pronto. O que me irrita é essa pretensa pontualidade dos ônibus aqui no país do relógio. Segundo: a maioria das lojas fecha às 18h ou 18:30. Vai ver que fui mimado por Nova Iorque… Terceiro: a galera aqui fuma feito chaminé, mesmo (ou principalmente) em locais públicos. Neste ar puro de montanha, isso deveria até ser crime ambiental.

Mas preciso finalizar o post em um tom mais alegre, escrevendo um pouco sobre as coisas de que gostei muito já nesta primeira semana. Genebra é uma cidade linda, com o lago e as montanhas e o verde e as cores do outono. Troinex também – pequena, residencial mas com um ar rural, muito tranquila e silenciosa. Em todos os lugares a água é praticamente medicinal. Inodora, incolor e insípida, como água deve ser, segundo o que a gente aprende no primeiro grau (ou melhor, nem aprende mais no primeiro grau, que agora é ensino fundamental… coisa de velho).

Há queijos de muitos tipos e de muito boa qualidade e com preço acessível. Só pra ter uma ideia: com $1 a mais do que eu pagava em Nova Iorque por dez fatias de queijo mussarela da marca genérica do supermercado (a mais barata!), aqui compro uma peça de 250g de camembert e outra de 250g de brie. Parece mentira, e eu tenho uma tendência ao exagero, mas pode confiar que desta vez estou sendo bastante preciso. Outra coisa que se encontra com alta variedade e qualidade e baixo preço é… chocolate! Bah, não é bom nem pensar, que já fico com vontade de comer chocolate.

Em resumo, acho que a terra do relógio vai conseguir o que a terra do fast food não conseguiu: me fazer engordar.

Encontros e despedidas

Com um tantinho de tristeza, devo dizer que este é o último post da série NYC 2009-2010. Agora que estou (geograficamente, pelo menos) distante da minha realidade nova-iorquina dos últimos 14 meses, tenho uma perspectiva mais ampla da minha mais recente saga – resolver minha vida em Nova Iorque e vir para a Europa em menos de uma semana. Neste post, convido o leitor a acompanhar a versão sem cortes dessa história, que é um dos mais belos exemplos do quanto Deus me tem abençoado por toda a minha vida. Escrevo este texto para os amigos que, de uma forma ou de outra (com ajuda prática ou em oração), fizeram parte desta saga, bem como para mim mesmo – minha memória já é fraca e algum dia eu acabaria esquecendo os detalhes se não os escrevesse.

Se tivesse que escolher uma data, eu diria que o complicado e doloroso processo de dizer adeus a Nova Iorque iniciou-se no final de semana de 18 e 19 de setembro. Passei o sábado com a sogra da minha irmã, que chegou do norte do estado de Nova Iorque para visitar o Zoológico do Bronx e também para ver Roosevelt Island, onde morei por mais ou menos cinco meses. No domingo, foi o aniversário da minha Confirmação – sempre me lembro da data, e este ano teve um quê a mais de significado, porque foi num domingo, como há 11 anos. Fui ao culto na City Grace Church, como fiz quase todo domingo por mais de um ano, mas sem dúvida foi diferente do típico domingo de 2009‒2010, não só por causa do aniversário. Os pastores anunciaram que eu estava indo embora para Genebra, contaram histórias sobre minha participação na comunidade no último ano, e oraram por mim. Ganhei um CD especial de fotos, um bolo de despedida e agradecimento, e uma quantidade atipicamente grande (mas de forma alguma inapropriada) de abraços. À noite, minhas duas boas amigas Dana e Natasha fizeram uma janta de despedida, à qual muitos outros amigos foram. Cada um deles compartilhou uma lembrança curta mas cheia de sentimento sobre mim, e eu dei um discurso de despedida (prolixo e sem inspiração).

Então fui pra casa e suspirei profundamente – por que eu tinha dito a todos que aquele era muito provavelmente o meu último domingo em Nova Iorque? Sim, meu estágio em Genebra deveria começar em duas semanas, e aquele domingo devia de fato ser meu último domingo em Nova Iorque antes de ir a Genebra via Frankfurt. Ainda assim, não conseguia me imaginar partindo. Embora minha ONG na Suíça tivesse solicitado meu visto com permissão de trabalho havia bastante tempo, ela ainda não tinha recebido a carta final de aprovação do governo suíço. Eu teria de levar essa carta ao Consulado-Geral da Suíça em Nova Iorque, onde carimbariam o visto em meu passaporte. Poderia levar ainda um mês para a carta chegar – ou poderia ser que a carta nem viesse. Isso trancava tudo. Como eu não tinha visto, não podia fazer planos. Não queria comprar passagens aéreas sem saber por certo quando (ou mesmo se) o visto chegaria, e portanto nenhuma motivação de fazer as malas (empacotar a vida). O que era ainda pior para um control freak como eu, não tinha nenhum jeito de tornar mais rápido o processo do visto, e era difícil até acompanhar esse processo.

Felizmente, aprendi algumas lições sobre vistos. Já tinha tido problemas com processos de solicitação de visto enervantemente demorados – em 2008, quando solicitei um visto alemão, e em julho de 2010, quando estava esperando pela extensão do meu visto americano de estudante. Primeira lição: surtar não ajuda nem um pouco. Embora isso seja bastante óbvio, infelizmente não é tão fácil evitar um surto. Segunda lição: se é que há qualquer coisa que ajude, só pode ser acompanhar de perto o processo de solicitação de visto junto à organização solicitante e, na medida do possível, junto ao governo estrangeiro ao qual se pede o visto.

Além disso, através de experiências relacionadas ou não à obtenção de vistos, aprendi muitas lições sobre o meu Deus. Uma lição importante é: Ele nunca me deixa na mão. Mesmo em situações quando inicialmente pensava que Ele o tinha feito (por exemplo, quando algo que eu queria muito e por que tinha orado não acontecia nunca), cedo ou tarde eu acabava percebendo que Ele não tinha me deixado na mão – em vez disso, Ele tinha me dado algo que eu nem tinha pensado que poderia ter e que era muito melhor que o originalmente almejado. De certa forma, acho que posso dizer que sou mimado de verdade por Ele.

Como qualquer control freak, preciso ter um plano, mas tentei ser uma criatura melhor, tornando essas três lições o núcleo do meu plano, assim:

  1. Não surtarei por causa desse processo de pedido de visto.
  2. Acompanharei insistentemente o processo junto à organização solicitante e ao consulado.
  3. Para atingir (1) e além de realizar (2), confiarei essa questão do visto a Deus.

(3) + (2) = Agostinho: “Ora como se tudo dependesse de Deus. (= 3) Trabalha como se tudo dependesse de ti. (= 2)”

Por favor, não pense que eu sou um herói. Sou bastante novo nessa determinação e ainda tenho que lutar contra minhas neuroses para poder pensar assim. Não é um superpoder inato.

De acordo com meu plano, fui ao Consulado-Geral da Suíça em Nova Iorque na segunda-feira, 20 de setembro (e viva o Rio Grande!). A ideia era perguntar como eu poderia acompanhar o processo do visto junto ao governo suíço, por que estava demorando tanto para minha organização solicitante receber a carta final de Berna, quais eram minhas opções se eu não recebesse a carta e o visto antes que vencesse meu visto americano (o que aconteceria logo, em outubro). Não vou entrar nos detalhes de quão mal eu fui tratado inicialmente; vou dizer apenas que, em algum momento durante um intrincado diálogo com a oficial consular, ela disse, “seu nome está em nosso sistema e estamos autorizados a dar-lhe o visto”. Fiquei surpreso. Não fazia nenhum sentido – eu não tinha que trazer a carta que a organização solicitante receberia de Berna? Era um milagre inesperado que meu nome estivesse no sistema deles. Fui ao consulado novamente na terça-feira para deixar meu passaporte e ainda uma vez na quarta-feira para buscá-lo – com um visto suíço!

A notícia de que eu teria meu visto na quarta-feira desencadeou intensos preparativos para partir imediatamente. Na terça-feira, encontrei uma passagem aérea com preço decente para ir de Nova Iorque a Frankfurt no sábado. Depois de terminar um trabalho de tradução cujo prazo terminava na quarta-feira à tarde, comecei a fazer as malas, uma tarefa que eu só concluiria na sexta-feira à tarde. Após vender, doar, enviar pelo correio, ou jogar fora muitas de minhas coisas, consegui encher duas malas para despachar. Cada uma delas pesava o máximo que a companhia aérea aceitaria levar, mesmo pagando excesso de bagagem (o que eu teria de fazer, inevitavelmente). Minha bagagem de mão tinha o dobro do peso permitido. Então olhei à minha volta… e para o meu pavor ainda tinha um monte de coisa pra levar! Decidi simplesmente jogar tudo dentro das duas malas grandes e torcer que a companhia aérea não fosse muito rigorosa.

No meio da loucura de fazer malas, ainda tive a oportunidade de dar adeus individualmente a muitos amigos, inclusive alguns que não tinham ido à festa de despedida. Na terça-feira, tive um almoço italiano com a Maurizia da NYU, sobremesa-tardia (e uma sobremesa maravilhosa) com a gourmet Christine da City Grace, e um jantar memorável em um restaurante chique (para o qual eu tinha ganhado um vale-presente de $100!) com as irmãs Leslie e Stephanie da City Grace. Na quarta-feira, almoço e sorvete e conversa maravilhosa (como sempre) com o Kyle da City Grace. Na quinta-feira, a Isabela da NYU me ofereceu hospitalidade e comida típicas da Bahia, e mais tarde encontrei novamente a Leslie e a Stephanie em um evento beneficente que a Leslie ajudou a organizar. Na sexta-feira à tarde, a Natasha veio de Nova Jersey me visitar, o que foi um grande incentivo para eu terminar de empacotar (incluindo café, de que eu realmente precisava àquelas alturas). Na sexta-feira à noite, minha última noite em Nova Iorque, fui à festa de inauguração do loft de Kyle, Lee e Ryan, onde vi ainda uma vez muitos dos bons amigos que acabo de mencionar, bem como muitos outros (que não vou citar aqui, porque seria uma longa lista). Foi a forma perfeita de terminar um ano maravilhoso em Nova Iorque.

Em todos os momentos, mas especialmente quando as coisas não pareciam ir muito bem nos meus preparativos, era evidente que eu permanecia sob o cuidado de Deus.

  • Nunca tinha tido problemas para chegar a Roosevelt Island com o metrô F – exceto, é claro, no meu penúltimo dia em Nova Iorque, quando perdi algumas horas por causa de atrasos, acidentes e mudanças de rota inesperadas. Mas nem a MTA (Metropolitan Transit Authority, empresa de transporte público de Nova Iorque) podia me deter: apesar da perda de tempo, ainda consegui me aprontar em tempo.
  • No sábado, o táxi que deveria me levar de Roosevelt Island até a parada do ônibus expresso entre Midtown e o aeroporto de Newark não consegui chegar bem até a parada, por causa de ruas interrompidas em Manhattan. Felizmente, Deus enviou-me um dos Seus anjos, meu amigo Naoki, que me ajudou a carregar as malas até a parada de ônibus.
  • Quando cheguei ao aeroporto de Newark, fiquei em choque quando o ônibus parou e me largou na área de desembarque, não de embarque. Tão frustrante! Tinha que dar um passo adiante com uma das malas, então voltar para pegar as outras duas malas e trazê-las junto à primeira – e assim por diante. Era humanamente impossível carregá-las todas ao mesmo tempo e não havia carrinhos por perto. Aí, do nada, um funcionário do aeroporto se aproximou e me trouxe um carrinho!
  • Então, fui ao balcão da companhia aérea, fazer check-in. Ambas as malas grandes passaram – miraculosamente, até, porque eu sabia que ambas pesavam mais que o máximo permitido. Além disso, não só a moça nem me pediu pra pesar minha mala de mão, mas também ofereceu para despachá-la sem custos adicionais. Inacreditável! Finalmente, ela me ofereceu um assento de corredor (meu tipo preferido) na fila de uma saída de emergência (o espaço para minhas pernas era tão enorme que eu podia dançar valsa ali). E nem precisei pedir.

Tudo parecia estar preparado pra mim. Só Deus poderia ter feito isso dessa maneira. Ele cuidou de detalhes em que eu nem pensei.

Quando desembarquei em Frankfurt, Alemanha, meus pais já estavam esperando por mim no portão. Contei a eles toda esta saga enquanto dirigíamos a Limburg, bem a tempo do culto na igreja evangélica de que minha irmã e meu cunhado participam. À medida que eu me acalmava, sentado na igreja, finalmente percebia que tinha chegado. No domingo anterior, meu aniversário de Confirmação, estava eu em Nova Iorque, dizendo adeus à minha comunidade e aos meus amigos, mas não tinha nem ideia de que receberia o visto e partiria tão rápido. Apenas uma semana depois, estava eu na Europa, com meus pais. Minha irmã e meu cunhado, que eu estava tão feliz de poder ver de novo depois de um ano, em breve chegaria com minha sobrinha e meu sobrinho, que eu estava tão feliz de poder ver pela primeiríssima vez! Eu me sentia realizado, embora exausto da viagem. Não tinha conseguido dormir nada no voo. Além disso, tinha que conciliar a euforia de encontros e desencontros com a tristeza de deixar para trás uma realidade que eu verdadeiramente amava – não estava mais morando em Nova Iorque, aquela igreja não era a City Grace Church, e nenhum dos meus amigos estava ali.

Meu nível de alemão é iniciante (não estou sendo modesto), definitivamente não suficiente para entender um culto inteiro em alemão. Pego umas palavras aqui e ali, infiro algumas a partir do contexto, e isso me permite chegar a um entendimento de uns 65% do que está sendo dito. E não faço ideia de daonde tirei esses 65%, porque é provavelmente bem menos que isso. Ainda assim, por alguma razão divina, eu entendi bem claramente quando o pastor disse que o versículo bíblico da semana era I João 5:4:

“…porque tudo o que é nascido de Deus vence o mundo. E esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé.”

Fiquei paralisado. Imediatamente interpretei o versículo à luz dos eventos recentes na minha vida – vencer desafios terrenos através da fé e da confiança em Deus. Mas isso era apenas a ponta de um iceberg de significado. Lágrimas começaram a correr dos meus olhos no momento em que ouvi o versículo. Só consegui me virar para o meu pai, que estava sentado ao meu lado – “Pai, tu te lembras? É o meu versículo de Confirmação!”

Eu já tinha derramado algumas lágrimas em três ocasiões no processo de partida de Nova Iorque e já tinha falhado na minha determinação de chorar somente quando estivesse no avião para a Europa. Primeira vez: quando voltei a Roosevelt Island depois da festa de inauguração do apartamento dos meus amigos, minha última noite em Nova Iorque. Segunda vez: quando entrava no túnel Holland, saindo de Manhattan a caminho de Newark. Terceira vez: durante o voo, especialmente quando li os cartões de despedida que o Naoki e a Stephanie escreveram (bem, o Naoki intencionalmente escreveu o seu como um “auxílio para chorar”, para o caso de eu ter me esquecido de levar uma cebola para cortar, como ele mesmo colocou, e a Stephanie disse que o dela era muito “emotional and crap” [difícil traduzir!], nas palavras dela mesma, então não é surpresa que eles me fizeram chorar). Mas aqueles momentos foram diferentes. Eu tinha a situação sob controle e não deixei ninguém ver. Desta vez, em Limburg, eu simplesmente não conseguia parar. Acho que só consegui quando lembrei que conheceria logo minha sobrinha e meu sobrinho de dois meses de idade, e quando percebi que eles teriam se comportado melhor durante o culto do que o seu tio de 25 anos.

Falando bem sério, não sei exatamente por que eu estava chorando – talvez porque estivesse tão aliviado de ter chegado com segurança depois da minha saga, ou porque estivesse triste por sair de Nova Iorque, ou porque estivesse feliz de estar na Europa e de ver minha família de novo, ou por causa de um mix de todas essas razões. Sempre se pode racionalizar e pensar que eu estava exausto e particularmente sensível e sei-lá-o-quê, mas outra possibilidade é que eu tivesse sido movido pelo Espírito. É difícil explicar ou descrever. Foi muito intenso. Minha ousadia em compartilhar essa história só se explica pela minha imensa gratidão a Deus.

Pra deixar o blog perfeitamente atualizado, não bastam estas 2.500 palavras; faltam ainda algumas. Escrevi o post (até o parágrafo anterior) originalmente em inglês, para dar notícias aos amigos em Nova Iorque, mas resolvi traduzir porque os amigos brazucas também merecem a atenção e um relatório completo. Aliás, ainda mais completo, escrito à medida que a história acontece. Do domingo 26 de setembro até hoje (sábado 2 de outubro), fiquei com minha família na região do Westerwald, na Alemanha, babando um pouco nos sobrinhos Isabel e Felipe.

Hoje, às 9h da manhã, tomei um trem rumo a Genebra via Frankfurt e Basileia. Chego em Genebra por volta das 18h. Na estação, vai me esperar o senhor em cuja casa vou alugar um quarto durante esse meu período aqui (até meados ou fins de janeiro do ano que vem). Fica em Troinex, a sudeste de Genebra.

Escrevo durante a viagem de trem. Escrevendo, contemplando, ouvindo música. Destaques da minha playlist de viagem:

  • Empire State of Mind, do Jay-Z (porque sair do “empire state of mind” é uma tarefa difícil)
  • Sonatas de violino de Beethoven (porque achei apropriado para o trecho alemão da viagem)
  • Songs In and For Curious Times (uma coletânea – presente de despedida do amigo Kyle)
  • Zooropa (porque U2 é U2, ora; não precisa de justificativas)
  • Encontros e Despedidas, com Maria Rita (porque achei apropriado para o contexto ferroviário)

Agora que estou no último trecho (Basileia–Genebra), já em território suíço, posso fazer alguns comentários sobre as primeiras impressões da chegada. E só algumas, porque quero parar de escrever logo pra curtir a paisagem! Na Alemanha estava chuvoso, mas desde que entramos na Suíça tem feito um dia lindo de sol, que só faz destacar a beleza natural do lugar. O trem faz curvas por entre os morros e entra em longos túneis e passa por pequenas cidades encantadoras. O que se vê ao redor são morros cobertos de florestas já com sinais de outono, o lago cercado de villas simpáticas e pontilhado de veleiros, as montanhas brancas dos Alpes à distância… é deslumbrante. Tô chegando…

Tem gente que chega pra ficar
Tem gente que vai pra nunca mais
Tem gente que vem e quer voltar
Tem gente que vai e quer ficar
Tem gente que veio só olhar
Tem gente a sorrir e a chorar
E assim chegar e partir
São só dois lados da mesma viagem

(Encontros e Despedidas)